A partilha de bens no divórcio é uma fase delicada na separação. Isto porque esta divisão muitas vezes não se resume a verificar o montante adquirido pelo casal e repartir por dois. Comumente, um dos cônjuges tem preferência por permanecer com um bem, enquanto o outro prefere a venda, entre outras diversas questões.
Quando se fala em divisão de bens no divórcio, o primeiro aspecto a ser verificado é o regime de casamento. É ele que determina como será partilhado o patrimônio do casal. No Brasil, o regime legal é o da comunhão parcial de bens, razão pela qual rege grande parcela dos casamentos no país. Uma das principais regras deste regime é que só serão partilhados os bens adquiridos durante a constância do casamento. Porém, uma dúvida que surge é: e quando os bens foram adquiridos com valores obtidos pelas partes antes do casamento como, por exemplo, o FGTS? Como fica a partilha?
Em razão de programas federais permitirem saques dos valores do FGTS para a compra de imóveis, muitos casais vêm utilizando destas contas para adquirir o primeiro imóvel. Por isso tem sido grande a demanda nos tribunais, e aquele que utilizou o FGTS para quitar grande parte do imóvel tem pleiteado que a divisão do bem seja feita nos moldes do pagamento, e não do regime de bens. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que quando o imóvel é pago parcialmente com valor das contas do FGTS de um dos cônjuges, sendo este valor adquirido antes do casamento, a divisão do bem será feita conforme a proporção paga por cada um, e não de metade para cada.
Por exemplo, um casal adquire um imóvel no valor de R$ 200 mil, sendo que 80% do valor, o que corresponde a R$ 160 mil, foi pago com o saque do FGTS do marido. Os outros R$ 40 mil foram pagos com o patrimônio em comum. No divórcio, o marido terá direito a 80% do imóvel, já que 80% foram pagos por ele com valores obtidos antes do casamento (qual seja o depósito de FGTS) e a quota de 20% deverá partilhada entre as partes, já que tal parcela foi paga através de esforços comuns entre o antigo casal.
O que diz a jurisprudência?
O STJ, além de entender que a parte do imóvel comprado com FGTS adquirido antes do casamento não deve ser partilhado entre o casal que contraiu casamento em regime parcial de bens, também entende que, em eventual doação de valores a qualquer uma das partes, mesmo durante a vigência do casamento, também não será partilhada em divórcio. Tais regras são válidas para o casamento em regime de comunhão parcial de bens.
Segundo o STJ, se na doação dos valores feita durante o casamento o doador não especificou que os valores eram direcionados ao casal, na partilha o montante também não será dividido, em atenção à regra do art. 1.660, III, do Código Civil. Vejamos.
RECURSO ESPECIAL. CASAMENTO. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. DOAÇÃO FEITA A UM DOS CÔNJUGES. INCOMUNICABILIDADE. FGTS. NATUREZA JURÍDICA. PROVENTOS DO TRABALHO. VALORES RECEBIDOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. COMPOSIÇÃO DA MEAÇÃO. SAQUE DIFERIDO. RESERVA EM CONTA VINCULADA ESPECÍFICA. 1. No regime de comunhão parcial, o bem adquirido pela mulher com o produto auferido mediante a alienação do patrimônio herdado de seu pai não se inclui na comunhão. Precedentes. 5. Assim, deve ser reconhecido o direito à meação dos valores do FGTS auferidos durante a constância do casamento, ainda que o saque daqueles valores não seja realizado imediatamente à separação do casal. 6. A fim de viabilizar a realização daquele direito reconhecido, nos casos em que ocorrer, a CEF deverá ser comunicada para que providencie a reserva do montante referente à meação, para que num momento futuro, quando da realização de qualquer das hipóteses legais de saque, seja possível a retirada do numerário. 7. No caso sob exame, entretanto, no tocante aos valores sacados do FGTS, que compuseram o pagamento do imóvel, estes se referem a depósitos anteriores ao casamento, matéria sobre a qual não controvertem as partes. Diante do divórcio de cônjuges que viviam sob o regime da comunhão parcial de bens, não deve ser reconhecido o direito à meação dos valores que foram depositados em conta vinculada ao FGTS em datas anteriores à constância do casamento e que tenham sido utilizados para aquisição de imóvel pelo casal durante a vigência da relação conjugal. 8. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ – REsp: 1399199 RS 2013/0275547-5, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 09/03/2016, S2 – SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 22/04/2016)
Conclusão
Ainda que o regime de casamento determine a divisão de bens em eventual divórcio, existem regras previstas pela jurisprudência que são determinantes para uma partilha justa.
Por isso, busque sempre um advogado especialista no assunto!