A doação de bens de pais para filhos é uma possibilidade prevista no nosso Código Civil e se caracteriza como um adiantamento de legítima, isto é, uma antecipação de herança. No entanto, uma das preocupações frequentes dos doadores é quanto à possibilidade de o cônjuge do descendente ter acesso à parte do bem em eventual divórcio. A solução para esta questão é a inclusão da cláusula de incomunicabilidade no contrato de doação.
Neste artigo abordaremos sobre os principais aspectos do tema. Acompanhe!
O que é a cláusula de incomunicabilidade?
A cláusula de incomunicabilidade se caracteriza por uma imposição, na qual o bem doado não poderá ser partilhado com o cônjuge do beneficiário em eventual divórcio. Para que esta disposição seja válida, é importante que a cláusula esteja disposta no contrato de doação. Em se tratando de bem imóvel, este contrato deve ser realizado através de escritura pública, sob pena de nulidade. Vale ressaltar que a cláusula de incomunicabilidade pode ser inserida em qualquer tipo de doação, independente se bem móvel, imóvel ou até mesmo de dinheiro.
Além disso, deve-se inserir esta cláusula no caso de o beneficiário ser casado no regime de comunhão universal de bens, visto que, nos demais regimes de bens, em eventual divórcio, não se comunicam os bens recebidos em doação na constância do casamento.
A não aplicação da cláusula de incomunicabilidade em caso de sucessão
Um ponto relevante a ser considerado pelos doadores é que a cláusula de incomunicabilidade não se aplica em caso de morte do beneficiário da doação. Explicamos: como a lei determina que a incomunicabilidade se extingue com a morte do beneficiário, na abertura do seu inventário, o bem recebido em doação será partilhado com o cônjuge sobrevivente. Além disso, o Código Civil prevê que, independentemente do regime de bens, o viúvo é considerado herdeiro do falecido. Assim, este imóvel recebido em doação será, ao final, partilhado com o marido/esposa do beneficiário.
O que diz a jurisprudência?
Frequentemente, a imposição da cláusula de incomunicabilidade vem acompanhada das cláusulas de inalienabilidade e impenhorabilidade. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que, caso a doação tenha sido feita somente com as cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade, é presumível que o imóvel também não possa ser vendido.
Esta é uma questão que deve ser observada pelos doadores, caso seja de sua vontade que o receptor tenha direito à venda da propriedade. Vejamos.
RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE CANCELAMENTO DE GRAVAMES – PROCEDIMENTO ESPECIAL DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA – IMPENHORABILIDADE E INCOMUNICABILIDADE – DOAÇÃO – MORTE DO DOADOR – RESTRIÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE – INTERPRETAÇÃO DO CAPUT DO ARTIGO 1.911 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INSURGÊNCIA DA AUTORA. Quaestio Iuris: Cinge-se a controvérsia em definir a interpretação jurídica a ser dada ao caput do art. 1.911 do Código Civil de 2002 diante da nítida limitação ao pleno direito de propriedade, para definir se a aposição da cláusula de impenhorabilidade e/ou incomunicabilidade em ato de liberalidade importa automaticamente, ou não, na cláusula de inalienabilidade. 1. A exegese do caput do art. 1.911 do Código Civil de 2002 conduz ao entendimento de que: a) há possibilidade de imposição autônoma das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, a critério do doador/instituidor; b) uma vez aposto o gravame da inalienabilidade, pressupõe-se, ex vi lege, automaticamente, a impenhorabilidade e a incomunicabilidade; c) a inserção exclusiva da proibição de não penhorar e/ou não comunicar não gera a presunção do ônus da inalienabilidade; e d) a instituição autônoma da impenhorabilidade, por si só, não pressupõe a incomunicabilidade e vice-versa. 2. Caso concreto: deve ser acolhida a pretensão recursal veiculada no apelo extremo para, julgando procedente o pedido inicial, autorizar o cancelamento dos gravames, considerando que não há que se falar em inalienabilidade do imóvel gravado exclusivamente com as cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade. 3. Recurso especial provido. (STJ – REsp: 1155547 MG 2009/0171881-7, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 06/11/2018, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/11/2018)
Conclusão
Ainda que a lei permita a imposição da incomunicabilidade, é preciso salientar que ela só será válida se estiver disposta no contrato.
Por isso, é essencial que o contrato de doação seja redigido por um advogado especialista no assunto.