A redação de um testamento implica na enumeração de todos os bens do indivíduo. E, por vezes, é possível que um dos bens possua cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. Mas você sabe o que são cada uma delas? E mais: poderá um bem gravado com esta cláusula estar inserido em um testamento? Neste artigo trataremos dos principais aspectos desta questão.
O que é inalienabilidade?
Alienar um bem significa transferir, transmitir a sua propriedade a terceiros, seja de forma gratuita ou onerosa.
Deste modo, quando um bem vem gravado com uma cláusula de inalienabilidade, significa que o proprietário não poderá, sob nenhuma hipótese, vender ou ceder o bem a terceiros.
O que é incomunicabilidade?
A incomunicabilidade diz respeito a exclusão do bem no regime de bens do casal. Isto significa que, em eventual morte ou divórcio do proprietário, o bem gravado com esta cláusula não poderá ser dividido entre eles.
Veja a seguinte hipótese: João, casado com Renata em regime de comunhão parcial de bens, recebe um apartamento do pai, a título de doação, que vem gravado de incomunicabilidade. Posteriormente, João e Renata se divorciam. Na partilha de bens, o apartamento recebido por João não poderá ser dividido com Renata, em razão da cláusula de incomunicabilidade.
O que é impenhorabilidade?
A penhora é um meio de que o credor encontra de ter suas dívidas quitadas, a partir da execução dos bens do devedor.
Quando o devedor possui algum bem em condição de impenhorabilidade, a execução não poderá atingir esta propriedade em questão.
Vale ressaltar que, no geral, um bem é gravado com cláusula de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade a partir da sua doação, ou seja, a pessoa doa o bem um terceiro sob a condição de que a propriedade não possa ser vendida, nem comunicada ao cônjuge ou penhorada.
Afinal, um bem com qualquer uma destas cláusulas poderá fazer parte do testamento?
Verificado o significado de cada um destes termos, a resposta para esta questão é que sim, o bem gravado com cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade poderá fazer parte de um testamento.
Isto por que, o entendimento jurisprudencial e doutrinário é de que as cláusulas em questão só são válidas enquanto o proprietário estiver vivo. Após sua morte, consequentemente, o bem é transferido aos herdeiros, que, por sua vez, não possuem a obrigação de cumprir com a regra imposta na doação.
O que diz a jurisprudência?
Uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça exemplifica bem a regra geral sobre a validade do testamento que contém um bem com cláusula de inalienabilidade.
No caso em questão, as partes pleitearam a anulação de um testamento, já que um dos bens listados no rol possuía cláusula de inalienabilidade. No entanto, a decisão do STJ foi de que o testamento não é considerado nulo, já que a referida cláusula não possui efeitos após a morte do testador, o que, por consequência torna todo o testamento válido. Vejamos.
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. AÇÃO ANULATÓRIA DE TESTAMENTO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE, INCOMUNICABILIDADE E IMPENHORABILIDADE. VIGÊNCIA DA RESTRIÇÃO. VIDA DO BENEFICIÁRIO. ATO DE DISPOSIÇÃO DE ÚLTIMA VONTADE. VALIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC/1973 quando a Corte local pronuncia, de forma clara e suficiente, sobre as questões deduzidas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo. 2. Conforme a doutrina e a jurisprudência do STJ, a cláusula de inalienabilidade vitalícia tem duração limitada à vida do beneficiário – herdeiro, legatário ou donatário -, não se admitindo o gravame perpétuo, transmitido sucessivamente por direito hereditário. 3. Assim, as cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade não tornam nulo o testamento que dispõe sobre transmissão causa mortis de bem gravado, haja vista que o ato de disposição somente produz efeitos após a morte do testador, quando então ocorrerá a transmissão da propriedade. 4. Recurso especial provido para julgar improcedente a ação de nulidade de testamento. (STJ – REsp: 1641549 RJ 2014/0118574-4, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 13/08/2019, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/08/2019 RMDCPC vol. 92 p. 122)
Conclusão
Os termos discutidos neste artigo podem ser confusos, mas a ideia geral é simples: o proprietário do bem deverá manter a coisa consigo enquanto estiver vivo.
Assim, se você possui algum imóvel ou afim gravado com esta condição e deseja dispor dele em seu testamento, não existe nenhuma óbice para tanto.