Quem possui um imóvel e aluga-o para terceiros sabe que existem diversos trâmites determinados pela Lei do Inquilinato e isso não poderia ser diferente na questão da venda do imóvel.
Muitas vezes a venda do bem é uma ótima oportunidade, mas a existência de um inquilino gera dúvidas sobre qual procedimento deve ser feito, como se para a venda é necessário que antes o locatário desocupe bem. Existem algumas regras importantes a serem observados e que serão exploradas neste artigo.
Primeiro ponto: a lei permite que imóvel alugado seja vendido
Ainda que a lei permita a venda de imóveis que estejam alugados, a transação deve respeitar as regras estabelecidas pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991), que regula as locações de imóveis urbanos. Um ponto crucial é o Direito de Preferência do inquilino, assegurado pelos artigos 27 a 34 da lei em questão.
O Direito de Preferência garante ao locatário a prioridade na compra do imóvel antes de qualquer terceiro. Isso significa que, caso o proprietário decida vender o imóvel durante a vigência do contrato de locação, ele deve notificar o inquilino formalmente, oferecendo-lhe as mesmas condições apresentadas a outros interessados.
Por exemplo, imagine que Marcos, dono de um imóvel alugado a Joana, recebeu uma oferta de R$ 400.000,00 para vendê-lo. Antes de concretizar a venda com o comprador interessado, Marcos é obrigado a notificar Joana e oferecer a ela a opção de adquirir o imóvel pelo mesmo valor e condições. Se Joana recusar ou não manifestar interesse no prazo de 30 dias, Marcos estará livre para negociar com terceiros.
Para que a notificação do inquilino seja válida, é necessário que o documento contenha as seguintes informações: o preço do imóvel, as condições de pagamento, detalhes sobre dívidas ou encargos do imóvel e data, local e horário para verificação de documentos.
Esse comunicado deve ser entregue de forma que o recebimento pelo locatário seja comprovado, como por carta registrada ou e-mail com confirmação de leitura, sendo imprescindível que o proprietário guarde uma via da notificação enviada.
O inquilino não exerceu o direito de preferência e o imóvel foi vendido para terceiros. O que deve ser feito?
A continuidade do contrato de locação após a venda do imóvel depende de algumas condições:
- Cláusula de Vigência e Averbação na Matrícula: Se o contrato de locação possui uma cláusula de vigência e esta está devidamente registrada na matrícula do imóvel, o novo proprietário deve respeitar o contrato até o fim do prazo estipulado.
- Ausência de Cláusula de Vigência: Caso não haja cláusula de vigência registrada, o novo proprietário pode optar por não manter o contrato de locação, notificando o inquilino e concedendo um prazo de 90 dias para desocupação, conforme previsto na Lei do Inquilinato.
Sendo assim, caso o proprietário tenha intenção de vender o imóvel, é importante que a cláusula de vigência não seja averbada na matrícula. Caso você seja o locatário, solicitar que a cláusula de vigência seja averbada na matrícula pode ser uma saída para impedir que você tenha que desocupar o imóvel durante o prazo de vigência.
O que diz a jurisprudência?
Outra questão importante é que, caso o proprietário não envie notificação sobre o direito de preferência, ele poderá ser condenado ao pagamento de multa rescisória, em razão da rescisão antecipada. Conforme visto, o envio da notificação exime o proprietário do pagamento.
Neste caso julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a justiça condenou o proprietário ao pagamento por danos morais, além da multa prevista em contrato:
APELAÇÃO CÍVEL. Responsabilidade civil. Locação não residencial rescindida pela venda do imóvel. Inexistência de notificação prévia ao locatário quanto a venda ou eventual exercício de preferência. Omissão do locador quanto a seus deveres a ensejar a devolução da caução dada em garantia; pagamento da multa rescisória no valor de três meses de aluguel e danos morais quanto a perda dos investimentos realizados e fundo de comércio, bem estimados em R$ 50.000,00 RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. Majoração dos honorários a 15%. (0271058-13.2019.8.19.0001 – APELAÇÃO. Des(a). MARCELO ALMEIDA – Julgamento: 15/12/2022 – VIGESIMA PRIMEIRA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 19ª CÂMARA CÍVEL)
Conclusão
A venda de um imóvel alugado é viável, mas exige atenção a detalhes legais, como o respeito ao Direito de Preferência e a observação do contrato de locação.
Seguir as normas previstas pela Lei do Inquilinato e contar com o suporte de um advogado especializado são passos essenciais para garantir uma transação segura, evitando problemas futuros e protegendo os interesses de todas as partes envolvidas.