A transmissão de bens após a morte, quando o falecido não deixa testamento, pode dispender anos. E nesse tempo muita coisa pode acontecer com o patrimônio deixado, principalmente se parte dele for composto de investimentos na Bolsa de Valores.
Quando o valor dos investimentos é abundante significa que os rendimentos podem ser consideráveis, afinal, a depender da economia do país e da espécie de aplicação, os valores rentabilizados são de alto valor e isso, a longo prazo, pode significar a geração de um grande montante.
Assim, pensemos na seguinte hipótese: seu João, que reside em São Paulo, possuía R$ 700 mil aplicados em ações e vem a falecer em 10/02/2010. Devido aos contratempos entre os herdeiros e a demora no levantamento de bens e dívidas, a sentença do inventário ocorre somente em 05/10/2020. Nesta data, aqueles seus investimentos agora valem R$ 1,5 milhão. A pergunta é: sobre qual valor os herdeiros deverão recolher o imposto de transmissão (ITCMD)? Sobre os R$ 700 mil ou R$ 1,5 milhão?
De acordo com o Código Tributário Nacional, a base de cálculo do ITCMD é tomada a partir do dia da transmissão dos bens, que ocorre na morte do de cujus. Pela lei, a transmissão ocorre no dia do óbito do transmissor dos bens, ainda que a partilha venha ocorrer anos depois.
Deste modo, os herdeiros deverão recolher os 4% de ITCMD (referente a alíquota de São Paulo) sobre o montante de R$ 700 mil, o que totaliza o valor de R$ 28 mil de impostos somente pelo total de investimentos.
Tal regra disposta no Código de Tributário Nacional é positiva para os herdeiros que obtêm ganho nos rendimentos. Já para aqueles em que os investimentos se desvalorizam no decorrer do inventário, a obrigatoriedade de recolher impostos sobre um montante que nem existe mais pode se tornar um problema.
O que diz a jurisprudência?
Um dos aspectos relevantes sobre o cálculo correto do valor dos impostos de transmissão é quanto a possibilidade de responsabilização cível e criminal em caso de recolhimento a menor, nos casos dolosos.
No julgamento feito pelo STJ, os herdeiros utilizaram a base de cálculo incorreta para obter o valor do ITCMD a ser pago em razão dos investimentos deixados pelo falecido. A partir disso, o STJ, a pedido da Fazenda do Estado, determinou o recolhimento correto dos impostos devidos, devendo ser considerado o valor de mercado na data do óbito. Vejamos.
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.546.748 – SP (2019/0211598-6) RECURSO DE APELAÇÃO – DIREITO TRIBUTÁRIO – ITCMD – Autora, ora apelante, que recebeu, por meio de doação, ações de sociedade empresária – Recolhimento do ITCMD realizado pela autora em 2007. com base no valor patrimonial das ações – Apelante autuada em dezembro de 2012, em função do recolhimento a menor do tributo – Fisco Estadual que entendeu como correta base de cálculo o valor de mercado das ações – I. O ITCMD é tributo sujeito a lançamento por homologação e. em regra, o prazo decadencial para lançamento começa a correr a partir da ocorrência do fato gerador (art. 150. §4º, CTN) – Na hipótese, todavia, ficou comprovada a atuação dolosa da autora ao recolher o imposto a menor, valendo-se de base de cálculo incorreta – O dolo com que atuou a apelante faz com que o prazo decadencial siga a regra geral prevista no art. 173, I, do CTN. afastando a tese no sentido de ter havido a decadência – 2. Uma vez conhecido o valor de mercado das ações conforme comprovado nos autos, caberia à autora utilizá-lo como base de cálculo do ITCMD. nos termos do caput do art. 14 da Lei nº 10.705/00 – Precedentes deste Tribunal de Justiça: Conclui-se, daí, que a alíquota do ITMCD incide sobre o valor total transferido, sendo certo que os bens transferidos devem ser avaliados a preço de mercado, na data de transmissão ou do ato translativo. Em que pese a previsão do supra transcrito §3°, tem-se patente a primazia do valor de mercado das ações como base de cálculo para fins de apuração do valor devido de ITCMD. E, pelo que se extrai dos autos, não há como dizer que a autora não conhecia qual era o valor de mercado das ações que recebeu por meio de doação. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no Ag 853312/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 18/12/2007, DJe 17/03/2008) ANTE O EXPOSTO, nego provimento ao agravo. Publique-se. Brasília (DF), 26 de setembro de 2019. MINISTRO SÉRGIO KUKINA Relator
Conclusão
O conhecimento acerca de direito tributário e partilha é de extrema relevância quando os herdeiros recebem uma herança considerável, afinal, evita um recolhimento de impostos indevidos e também que os sucessores sejam condenados posteriormente por não recolher devidamente os tributos.
Por isso, antes de iniciar um processo de inventário procure um advogado especialista!