Pense na seguinte situação: você vai viajar para outro país e contrata um seguro saúde. Durante a viagem, você sofre um acidente e precisa de uma cirurgia. A data mais próxima para o procedimento é em semanas e nesta data você precisará estar no Brasil.
Será que neste caso o seguro saúde é obrigado a cobrir a nova cirurgia? Segundo uma decisão recente do STJ, não.
O caso decidido pelo STJ
No caso julgado pelo STJ, uma brasileira que viajava pela França sofreu uma queda e lesionou o braço, necessitando de uma cirurgia. Dada a proximidade do retorno da turista, o médico que a atendeu pelo seguro estabilizou o membro e a orientou a realizar a cirurgia no Brasil. Porém, ao buscar o seguro saúde para requerer o custeio do procedimento, o retorno dado pelo seguro é que a cobertura de tratamento era somente para o período em que ela estivesse no exterior. Ao recorrer à Justiça, o tribunal de primeira instância decidiu que o seguro não tinha o dever de custear o restante do tratamento, ainda que a lesão tivesse sido adquirida durante o período de cobertura.
O caso chegou ao STJ que, por sua vez, decidiu que a natureza do contrato de seguro garante ao segurado o tratamento para urgências e emergências durante o período de viagem, de modo que o contratante retorne estabilizado ao seu país de origem e assim procure um tratamento adequado. Com isso, este julgado abriu precedentes para que, em casos futuros, os seguros-viagem só sejam obrigados a custear os gastos durante o período de viagem.
O que fazer nestes casos?
Caso você esteja em outro país e venha a sofrer algum acidente que demanda hospitalização, é preciso ressaltar que, em regra, os seguros-viagem só são obrigados a cobrir o período contratado. Na hipótese de o segurado necessitar estender o plano, as seguradoras, no geral, requisitam a contratação de um novo plano. Porém, em razão de o segurado já estar em viagem, esta contratação é feita mediante um período de carência e legalmente isso é possível. Com isso, se o turista necessitar de um atendimento médico no momento da contratação, é possível que o seguro recuse a venda do plano. Logo, a recomendação é que o turista saia do Brasil com um seguro-viagem que contemple todo o período da viagem, sob pena de não poder adquirir um novo plano quando já estiver em outro país.
O que diz a jurisprudência?
Vejamos o recente entendimento do STJ sobre o tema:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO VIAGEM. AUTORA QUE SOFREU UMA QUEDA NO METRÔ DE PARIS, UM DIA ANTES DO RETORNO AO BRASIL, TENDO FRATURADO O PUNHO ESQUERDO. ATENDIMENTO MÉDICO DEVIDAMENTE REALIZADO NO EXTERIOR CUSTEADO PELA SEGURADORA RECORRIDA. ALTA MÉDICA REALIZADA ALGUMAS HORAS ANTES DO VOO DE RETORNO. CIÊNCIA DA VIAGEM PELO MÉDICO LOCAL, QUE, APÓS A REALIZAÇÃO DE EXAMES CLÍNICOS E DE RADIOGRAFIA, IMOBILIZOU O BRAÇO DA SEGURADA E RECOMENDOU CONSULTA COM CIRURGIÃO NO PAÍS DE RESIDÊNCIA. CONTINUIDADE DO TRATAMENTO MÉDICO REALIZADO NO BRASIL. EXCLUSÃO DE COBERTURA. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A controvérsia instaurada no presente recurso especial consiste em saber se a seguradora recorrida deve ser responsabilizada pelos gastos decorrentes do tratamento médico realizado pela recorrente no Brasil, em razão de acidente ocorrido durante viagem ao exterior. 3. O contrato de seguro viagem abrange, como regra, apenas as despesas médico-hospitalares limitadas ao tratamento de urgência ou emergência do segurado, até a sua efetiva estabilização, a fim de que possa continuar a viagem ou retornar ao local de sua residência com segurança. Logo, é da natureza da respectiva avença que, caso haja a necessidade de continuação do tratamento médico no país de residência do contratante, após a alta médica dada pelo hospital que prestou o atendimento no exterior, as despesas daí decorrentes não estarão cobertas pelo respectivo seguro, salvo disposição contratual em sentido diverso. 4. No presente caso, conforme consignado pelas instâncias ordinárias, havia, no contrato de seguro viagem firmado entre as partes, cláusula expressa no sentido de que estariam cobertas apenas “as despesas relacionadas à estabilização do quadro clínico do segurado que lhe permita continuar viagem ou retornar ao local de sua residência, não havendo cobertura para a continuidade e o controle de tratamentos anteriores, check-up e extensão de receitas”, além do que “o atendimento de urgência e emergência sob orientação médica deverá ocorrer enquanto o segurado estiver em viagem e respeitando o período de vigência do Bilhete de Seguro”, inexistindo qualquer ilegalidade ou abusividade nas respectivas cláusulas contratuais. 5. Recurso especial desprovido. (REsp n. 1.984.264/PR, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 14/6/2022.)
Conclusão
O seguro viagem é uma modalidade de seguro que ainda causa dúvidas aos brasileiros que viajam para o exterior.
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