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O que é fideicomisso? Como é usado o fideicomisso no testamento?

A transmissão de bens por inventário permite ao testador explorar diversas possibilidades, que vão desde a doação de bens aos herdeiros necessários e outros beneficiários, até mesmo a imposição de condições para o recebimento dos bens.

Uma destas possibilidades é o fideicomisso. Mas, você sabe o que é isso? Neste artigo iremos explorar os principais aspectos deste instituto. Acompanhe!

O que é fideicomisso?

O fideicomisso é uma disposição testamentária na qual o testador estabelece como regra a doação de um bem sob a condição de que, com a morte ou o decorrer do tempo, este beneficiário repasse o bem a um terceiro beneficiário.

O Código Civil traz o fideicomisso pela denominação substituição fideicomissária, assim definida: “Pode o testador instituir herdeiros ou legatários, estabelecendo que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário, resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem, que se qualifica de fideicomissário”.

Assim, o que se vê são três figuras: o testador, o fiduciário e o herdeiro fideicomissário.

O fiduciário é o indivíduo que receberá os bens, que serão de sua propriedade de forma temporária, ou seja, enquanto não ocorrer a condição estabelecida pelo testador. O herdeiro fideicomissário, por sua vez, é aquele que substituirá o fiduciário após ocorrida a condição especificada no testamento.

Deste modo, o que se verifica é que o testador escolhe quem receberá o bem, determina a condição de transmissão e estipula o segundo beneficiário.

Como ele pode ser utilizado na transmissão dos bens?

Primeiro, o fideicomisso só poderá ser instituído através de testamento. Aqui no blog já falamos das formas de testamento.

Sendo válido o testamento, a vontade disposta no documento deverá ser acatada pelos herdeiros, que deverão tomar todas as providências devidas para que seja cumprida a determinação do testador.

Nota-se que o fideicomisso poderá ser uma proteção aos concepturos, ou seja, aqueles que ainda estão por nascer. A partir daí, o testador estabelece que parte dos bens deverão ser transferidos à criança com o seu nascimento.

Qual a relevância do fideicomisso?

Pense na seguinte situação: João possui uma sobrinha, Ana, pela qual tem grande estima. No entanto, João tem idade avançada, enquanto Ana está no início da infância.

João pretende garantir os estudos de Ana e, para isso, estabelecerá em seu testamento o seguinte: parte dos seus imóveis e das suas cotas em uma empresa serão doados à sua irmã, Marcia, mãe de Ana. Quando Ana completar 18 anos, será obrigação de Marcia repassar estes bens à filha, como cumprimento da vontade do irmão.

Caso Marcia não realize o disposto no testamento, é possível que Ana ingresse com uma ação judicial, no intuito de que sejam cumpridas as vontades de seu tio. Além disso, enquanto os bens estiverem em posse de Marcia, ela não poderá vender ou dispor do patrimônio.

O que diz a jurisprudência?

Uma das dúvidas que comumente surgem entre testador, fiduciário e fideicomissário é a possibilidade de ser transmitido o bem recebido pelo fiduciário a terceiros, de modo a extinguir a doação ao fideicomissário.

No entanto, a jurisprudência tem seguido o entendimento de que tal transação não é possível. Um recente julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo mostra a compreensão do Judiciário sobre este tema. Vejamos.

FIDEICOMISSO. Autores fiduciários que pretendem a extinção do fideicomisso e transferência antecipada dos bens aos fideicomissários mediante doação. Inadmissibilidade. Fiduciários que detém a propriedade restrita e resolúvel, não podendo dispor sobre os bens. Extinção que somente se dá por renúncia ou superveniência da condição resolutiva. Ação improcedente. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SP – APL: 10554406720148260100 SP 1055440-67.2014.8.26.0100, Relator: Alexandre Marcondes, Data de Julgamento: 17/07/2016, 3ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/07/2016)

Conclusão

O que se verifica é que a figura do fideicomisso traz a possibilidade de o testador escolher o que fazer com os seus bens, de modo que as suas vontades deverão ser cumpridas mesmo após a sua morte.

Deste modo, poderá ser uma boa alternativa de garantir a manutenção de terceiros que sejam importantes para o testador.

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Terreno pode ser considerado bem de família?

Ter um imóvel considerado bem de família é uma proteção que garante que o núcleo familiar não terá a sua moradia penhorada em eventual execução judicial. A súmula nº 486 do STJ determina que o único imóvel da família que seja utilizado para fins econômicos é considerado bem de família, tendo em vista que o proveito financeiro obtido se reverterá à moradia. Mas, será que isso se aplica aos terrenos não edificados, isto é, aqueles em que não há qualquer edificação e, portanto, não são habitáveis? Para responder a esta questão, é preciso analisar o entendimento do STJ.

O conceito de bem de família na Lei nº 8.009/1990

Nos termos do art. 1º da lei que regula a impenhorabilidade do bem de família (Lei nº 8.009/1990), por bem de família se entende o imóvel de uso residencial, compreendendo a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa. Assim, já de início é possível entender que é necessária uma construção habitável para a caracterização do bem de família, o que excluiria os terrenos. Porém, existem julgados do Superior Tribunal Federal que levantam outros aspectos do bem de família e que caracterizam a impenhorabilidade deste tipo de bem.

O que entende o STJ sobre o tema

Como a súmula 486 do STJ estabelece que o único imóvel residencial da família que esteja locado para terceiros é considerado bem de família, indivíduos passaram a alegar judicialmente que o terreno não edificado também pode receber esta classificação. Neste sentido, o STJ decidiu em um processo que versava sobre a penhora de um terreno familiar utilizado como estacionamento, que o terreno não edificado que seja utilizado para fins econômicos pode ser considerado bem de família. Assim, este se tornou um requisito importante para que o lote da família, desde que seja o único imóvel do núcleo familiar, seja considerado bem de família.

Outra decisão importante proferida pelo STJ é que o imóvel em construção também é considerado bem de família e, portanto, é impenhorável.

Em um processo julgado em outubro de 2022, o STJ decidiu que, ainda que o imóvel não seja habitável, a sua caracterização como bem de família é antecipada, tendo em vista a construção da morada futura da família.

O que diz a jurisprudência?

Ainda que o terreno também seja considerado bem de família, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro já decidiu que, caso o terreno comporte a casa do devedor e um segundo imóvel, é possível desmembrar estes imóveis e realizar a penhora do bem que não é utilizado para a moradia.

CIVIL. PENHORA DE ACESSÃO CONSTRUÍDA EM TERRENO DA EXECUTADA. EXISTÊNCIA DE OUTRA CASA NO MESMO TERRENO. BEM DE FAMÍLIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. IMPENHORABILIDADE AFASTADA. Ao definir o bem de família, o legislador pretendeu garantir o mínimo necessário para habitação familiar. No caso em tela, consta dos autos que no terreno da agravada existem duas casas, sendo uma utilizada para sua habitação e a outra alugada para terceiros. Assim, a penhora da acessão objeto da lide não prejudicará o direito de habitação da recorrente, já que poderá utilizar o outro imóvel para sua habitação. Por outro lado, a demanda versa sobre dívida decorrente do bem indicado a penhora, o que afasta a sua impenhorabilidade, nos termos do § 1º do art. 833 do CPC. Provimento do recurso para deferir a penhora da acessão. (TJRJ – 0016402-93.2019.8.19.0000 – AGRAVO DE INSTRUMENTO. Des(a). LINDOLPHO MORAIS MARINHO – Julgamento: 22/10/2019 – DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL)

Conclusão

A partir das decisões recentes do STJ, se você possui um terreno e vem sendo executado judicialmente, uma saída é que seja atestado ao juízo que a moradia da família está em construção, de modo a ser aplicada a impenhorabilidade, de acordo com o que decidiu o STJ.

Em caso de dúvidas, consulte um advogado!

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Pessoa doente pode contratar seguro de vida?

Contratar um seguro de vida é uma medida que denota cuidado aos familiares do segurado, pois, afinal, estes valores são cruciais para o pagamento das despesas decorrentes do falecimento, como velório e inventário. Porém, uma das perguntas feitas pela seguradora no momento da contratação é se o segurado possui alguma doença pré-existente. Seria essa pergunta lícita? O seguro pode se negar a pagar o prêmio se for constatado que a doença era anterior à contratação? Acompanhe este artigo e veja o que têm entendido os tribunais.

A Súmula nº 609 do STJ

Diante dos inúmeros questionamentos na Justiça sobre a negativa dos seguros de vida em pagar o prêmio a pessoas que contratam o plano com doenças preexistentes, o STJ editou a Súmula nº 609, que diz o seguinte: “A recusa de cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente, é ilícita se não houve a exigência de exames médicos prévios à contratação ou a demonstração de má-fé do segurado”. Com isso, é importante considerar o dever do segurado de informar qualquer doença preexistente ao preencher a Declaração Pessoal de Saúde (DPS), que é o documento onde o segurado informa o seu estado de saúde.

Em um contrato de Seguro de Vida, a seguradora determina o valor do prêmio com base no risco apresentado no contrato. Isso significa que, se o segurado omitir uma doença que possui e, posteriormente vier a falecer em decorrência desta doença, caso a seguradora consiga comprovar a pré-existência, o prêmio poderá ser negado.

O aumento do valor do seguro é lícito?

Quando o segurado declara a doença na contratação do seguro, é comum que as seguradoras passem a cobrar um valor maior de pagamento mensal. Tendo em vista a natureza dos seguros, com base no risco, é plenamente possível que o valor pago seja superior ao cobrado de pessoa sem doença pré-existente. Por isso, vale a pena pesquisar entre as seguradoras qual delas cobra menor valor de segurado com doença anterior à contratação.

O que diz a jurisprudência?

A jurisprudência vem se alinhando à Súmula nº 609 do STJ e determinando o pagamento de indenização por danos morais ante a negativa da seguradora. Vejamos.

APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE SEGURO. DIAGNÓSTICO DE DOENÇA (CÂNCER DE MAMA) NO PERÍODO DE VIGÊNCIA, CONFORME BIÓPSIA REALIZADA PELA AUTORA-SEGURADA. NEGATIVA DE INDENIZAÇÃO QUE SE MOSTRA INDEVIDA, ANTE A AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DOENÇA PREEXISTENTE NO MOMENTO DA CONTRATAÇÃO, SENDO CERTO NÃO FOI EXIGIDO EXAME MÉDICO PARA CELEBRAR A AVENÇA, NOS MOLDES DO QUE PREVÊ A SÚMULA 609 DO STJ. COM EFEITO, PREENCHIDOS OS REQUISITOS ENSEJADORES DA RESPONSABILIDADE CIVIL, REFORMA-SE A SENTENÇA PARA JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO DE COMPENSAÇÃO PELOS DANOS MORAIS SOFRIDOS. MONTANTE DE R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS) QUE SE MOSTRA EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PRECEDENTES. RECURSO DO RÉU A QUE SE NEGA PROVIMENTO E RECURSO DA AUTORA A QUE SE DÁ PROVIMENTO.

(0193946-31.2020.8.19.0001 – APELAÇÃO. Des(a). FERNANDO FERNANDY FERNANDES – Julgamento: 15/02/2023 – DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL)

Conclusão

Ainda que a Súmula nº 609 do STJ traga regras diretas ao consumidor, é certo que houve grandes complicações para as seguradoras, já que agora precisam provar a má-fé do segurado para negar cobertura a um evento não coberto. De toda forma, o recomendável é que os consumidores sempre sejam claros e precisos na contratação dos seguros de vida, no intuito de evitar possíveis prejuízos aos seus herdeiros.

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Declare por escritura pública como deseja ser tratado por médicos e hospitais quando não puder expressar a sua vontade – Testamento vital

Pense na seguinte situação: você sofreu um acidente que te deixou debilitado e, por isso, precisará de tratamentos invasivos para continuar a sua vida. Sem estes tratamentos, você irá falecer mais rápido, de forma natural. No entanto, estes tratamentos poderão te causar mais sofrimento.

Assim, sua escolha seria entre continuar vivendo a partir dos tratamentos ou recusá-los, de modo que a morte se tornaria certa em um curto espaço de tempo? E mais: o que você acha que sua família iria optar?

Esta é uma questão extremamente polêmica e delicada, e que pouco é conversada entre as famílias. Mas, se a sua opção é a de afastar estes tratamentos e proteger a sua vida, saiba que existe um instrumento dentro do mundo jurídico que pode fazer valer a sua vontade: o testamento vital.

O que é o testamento vital?

O testamento vital é um documento em que o testador dispõe sobre como deseja que seja o fim da sua vida. Ele é um importante meio de proteção das vontades do indivíduo, que terá a autonomia de escolher como serão os últimos dias de sua vida.

O Código Civil não prevê este tipo de testamento, de modo que a sua existência ocorre com base na análise do direito à vida e dos entendimentos jurisprudenciais.

Neste tipo de testamento, o testador deve esclarecer se deseja receber certos tipos de tratamentos, em caso de ser acometido por alguma enfermidade, ou se não deseja receber qualquer tipo de tratamento, na hipótese de doença grave.

Vale ressaltar que o Brasil proíbe a eutanásia, de modo que o testamento vital será nulo se nele for previsto que, em caso de doença grave, deverá ocorrer a morte assistida do testador.

Como posso realizar este tipo de testamento?

Primeiro, o interessado deverá buscar um advogado e um médico. O primeiro irá redigir o documento, evitando que sejam incorridos quaisquer tipos de nulidade, e o segundo acompanhará a redação, para que estejam previstas todas as questões as quais o Conselho de Medicina ordena para este tipo de documento.

Após isso, o testador deverá registrar o documento em um Cartório de Notas, através de escritura pública, de modo a tornar efetivo o documento. A partir daí, o advogado ou uma pessoa próxima do testador deverão receber uma cópia do documento para que, em eventual situação em que o testador seja acometido por uma grave enfermidade, o corpo médico que o está tratando possa aplicar as disposições contidas no documento.

O que diz a jurisprudência?

A possibilidade de declarar a vontade sobre os tratamentos médicos aplicados através de escritura pública é uma previsão legal que auxilia na não judicialização deste processo.

Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu o caso de uma mulher que acionou o judiciário no intuito de que fossem estabelecidas as suas vontades e diretivas médicas, a serem aplicadas em eventual situação de grave e irreversível enfermidade. No entanto, a mulher não sofria de qualquer doença.

Assim, o magistrado responsável pelo caso decidiu que um processo judicial não seria o meio mais adequado de serem estabelecidas tais vontades, já que a escritura pública é o meio a ser utilizado para o caso em que questão. Vejamos.

JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE. ORTOTANÁSIA. Pretensão de estabelecer limites à atuação médica no caso de situação futura de grave e irreversível enfermidade, visando o emprego de mecanismos artificiais que prolonguem o sofrimento da paciente. Sentença de extinção do processo por falta de interesse de agir. Manifestação de vontade na elaboração de testamento vital gera efeitos independentemente da chancela judicial. Jurisdição voluntária com função integrativa da vontade do interessado cabível apenas aos casos previstos em lei. Manifestação que pode ser feita por meio de cartório extrajudicial. Desnecessidade de movimentar o Judiciário apenas para atestar sua sanidade no momento da declaração de vontade. Cartório Extrajudicial pode atestar a livre e consciente manifestação de vontade e, caso queira cautela adicional, a autora poderá se valer de testemunhas e atestados médicos. Declaração do direito à ortotanásia. Autora que não sofre de qualquer doença. Pleito declaratório não pode ser utilizado em caráter genérico e abstrato. Falta de interesse de agir verificada. Precedentes. Sentença de extinção mantida. Recurso não provido. (TJ-SP – AC: 10009381320168260100 SP 1000938-13.2016.8.26.0100, Relator: Mary Grün, Data de Julgamento: 10/04/2019, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/04/2019)

Conclusão

A partir do testamento vital, as vontades do testador poderão ser postas em prática em eventual acometimento de doença grave.

No entanto, além do atendimento de todas as questões burocráticas, é extremamente importante que as pessoas próximas ao testador estejam dispostas a respeitar as vontades contidas no documento, já que serão elas que terão, na maioria dos casos, contato com o corpo médico que atenderá o testador.

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Quando o idoso é vítima de fraude financeira e coloca em risco o patrimônio familiar. O que fazer?

Infelizmente, a cada dia se tornam mais comuns os casos de fraude financeira aplicada a idosos. O isolamento social, realidade vivenciada pelo mundo nesta época de pandemia gerada pelo covid-19, tem aumentado o número de casos deste tipo. A justificativa é que, neste período em que os bancos têm dado preferência ao atendimento remoto, têm crescido as formas de aplicação destes golpes. A nova tática dos criminosos é informar que agora o procedimento de verificação de dados do cliente é por telefone e em uma chamada captam os dados do idoso, como documentos pessoais, dados do cartão e senha.

Mas o que fazer se um idoso de minha família for vítima de um golpe?

O nosso ordenamento jurídico, através do Código de Defesa do Consumidor, art. 6º, inciso VI, prevê que é dever da prestadora de serviços reparar os danos materiais e morais sofridos pelo consumidor em decorrência da falha da prestação dos serviços. Deste modo, em caso de prejuízo sofrido pelo idoso em decorrência de falha na segurança da instituição bancária, por exemplo, é possível que o banco seja responsabilizado pelo prejuízo auferido e indenize o cliente.

Um exemplo está na jurisprudência. Em um caso julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ APL 0020981-09.2015.8.19.0038), uma idosa foi vítima de um golpe, no qual o criminoso realizou um empréstimo consignado em seu nome e o banco efetivou a transação, posteriormente descontando os valores da conta da senhora. O desembargador do caso decidiu que estava configurado o dano material e moral contra a idosa, e determinou que o banco a indenizasse por isso.

Assim, se a fraude sofrida pelo idoso tiver relação com um banco, são grandes as chances de que tenha havido negligência por parte da instituição bancária e, em um eventual processo judicial, seja determinada a indenização do cliente.

Meios de evitar a fraude financeira

No entanto, ainda que haja caminhos para o ressarcimento em caso de golpe, ninguém deseja passar por uma situação como essa. Por isso, elencamos algumas formas de evitar que este tipo de fraude ocorra.

Será dever da família do idoso orientá-lo a desconfiar das propostas que ele recebe de qualquer desconhecido; de não abrir e-mails suspeitos e nem atender chamadas estranhas e que sejam classificadas como spam; não passar a senha e/ou dados do cartão a ninguém. Além disso, um ponto importante de orientação ao idoso é quanto às pessoas que porventura apareçam na residência com a justificativa de que são representantes do banco. As agências bancárias nunca mandam representantes até a casa dos clientes. Por fim, um meio interessante de dirimir prejuízos é distribuir as quantias em mais de um banco ou conta, no intuito de que, em caso de fraude, haja outras reservas em dinheiro.

Seguindo estes passos, não só o idoso, mas também todo o patrimônio da família poderá ficar protegido contra fraudes.

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Quando os netos tem direito a herança dos avós?

É comum que avós e netos tenham uma relação de proximidade, tantas vezes marcada pelo abandono dos genitores, quando os avós surgem como forma de suprir esta lacuna. Por isso, a dúvida que surge é: é possível que os netos tenham direito à herança dos avós? A resposta é: depende. E explicaremos melhor adiante.

Em regra, são considerados herdeiros necessários somente os descendentes, ascendentes e cônjuge. Ainda que netos sejam descendentes, eles só poderão ser considerados herdeiros necessários quando não estiverem mais vivos quaisquer descendentes diretos, ou seja, os filhos. Assim, caso um senhor tenha tido 2 filhos e 4 netos e venham a falecer os 2 filhos, a herança deste senhor será repassada diretamente aos netos, já que eles são os herdeiros necessários. Vejamos as hipóteses abarcadas pelo nosso ordenamento jurídico.

  • Avós que possuem todos os filhos e netos vivos

Quando um avô possui todos os filhos e netos vivos e vem a falecer, só terão direito à sua herança os seus filhos, não tendo direito de cotas os netos. A possibilidade de os netos terem direito à herança só é possível em caso de testamento, no qual o avô deixa a cota disponível aos netos, se assim desejar.

  • Avós que possuem filhos vivos, um filho falecido e netos vindos de todos os filhos

Nesta hipótese, quando um filho falece antes do pai, os netos atuam como representante deste herdeiro, de modo que concorrerão à herança em nome do seu genitor. Nota-se que, independentemente do número de filhos do descendente falecido, todos eles partilharão da cota do pai. Por exemplo, o avô tem 4 filhos e este filho falecido possui 5 filhos também. Os filhos do descendente falecido, juntos, terão direito a 25% dos bens do avô, totalizando 5% do patrimônio para cada neto.

  • Criança que teve a mãe morta no parto tem direito à herança dos avós maternos?

Este caso é o mesmo do item anterior, ou seja, do descendente morto e que deixa netos ao avô. Ainda que a mãe morra durante o parto, ela constará no registro do menor como sua genitora, de modo que a criança terá todos os direitos patrimoniais decorrentes da relação entre mãe e filho.

  • Bônus: criança que foi criada pelos avós como filho

Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90 – ECA), é vedada a adoção dos netos pelos avós. No entanto, numa recente decisão do STJ (REsp 1635649 SP), a ministra relatora do caso permitiu que a avó adotasse o neto, dada a relação de mãe e filho configurada desde o nascimento e abandono da genitora do menor. A permissão da ministra teve como fundamento a relação já configurada de mãe e filho entre as partes, mas também pela possibilidade decorrente de que o menor tivesse acesso a todos os direitos patrimoniais decorrentes da relação, como o direito à herança.

Assim, o Poder Judiciário mais uma vez vem se adequando para atender às necessidades da vida prática que não estão previstas em lei.

Ficou com alguma dúvida? Comente abaixo!

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Meu pai fez uma doação para meu irmão em vida do imóvel mais valorizado que ele tinha, posso pedir a parte do imóvel?

A doação antecipada dos bens a herdeiros é uma possibilidade prevista no ordenamento jurídico brasileiro e contempla aqueles que desejam auxiliar financeiramente um descendente ou até mesmo para evitar problemas complexos após a morte do doador.

No entanto, uma das questões mais discutidas entre os herdeiros é quanto ao valor dos bens doados em vida e a divergência dos valores doados aos demais herdeiros. Seria possível pedir parte do valor do bem doado em razão da dissidência do montante destinado a cada um?

Por exemplo, se um genitor doa em vida um imóvel no valor de R$ 500 mil para um dos filhos e o valor destinado aos outros dois filhos foi de R$ 700 mil, seria possível os outros dois herdeiros solicitarem ao herdeiro que antecipou sua herança as suas cotas correspondentes?

A resposta é sim.

No direito civil brasileiro existe o instituto da colação de herança, que permite a antecipação de herança a um herdeiro necessário. No entanto, dentro do instituto está garantido que a antecipação deve ser dentro da cota correspondente do herdeiro, ou seja, a parte doada antecipadamente deve ser a mesma destinada os demais beneficiários.

Por exemplo, se um indivíduo possui patrimônio de R$ 900 mil e possui como herdeiros necessários três filhos, cada filho terá direito a R$ 300 mil de herança. No entanto, se em vida ele doou a um filho uma cota de R$ 400 mil, este herdeiro, após a partilha, deverá devolver R$ 100 mil aos demais herdeiros. Ou, como opção, o doador em vida deverá aumentar o seu patrimônio para que, após a sua morte, a cota doada em vida seja correspondente a uma parte justa da herança. Também é possível que o doador realize um testamento e estabeleça que a doação foi correspondente à herança necessária e também como a cota disponível para testamento.

Esta regra evita que um dos herdeiros se beneficie mais em relação aos demais.

O que diz a jurisprudência?

Uma recente decisão do STJ determinou que o valor a ser considerado na abertura do inventário é o valor do bem na data da doação, e não o valor de mercado quando do início de processo de partilha.

No caso em questão, o doador havia doado um imóvel em vida, onde, na data da partilha, por ter sofrido melhorias, foi valorizado, e assim, custava um valor superior ao da data do recebimento. Deste modo, para efeitos de devolução de valores pelo beneficiário, o STJ considerou o valor estimado quando da doação. Vejamos.

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INVENTÁRIO. COLAÇÃO DE BENS PELO VALOR CERTO OU ESTIMADO. PROTEÇÃO DOS HERDEIROS QUE NÃO FORAM CONTEMPLADOS PELO ADIANTAMENTO DA LEGÍTIMA DE EVENTUAIS INFLUÊNCIAS DE ELEMENTOS EXTERNOS DE NATUREZA ECONÔMICA, TEMPORAL OU MERCADOLÓGICA. SUBSTITUIÇÃO DO CRITÉRIO LEGAL PELO CRITÉRIO DO BENEFÍCIO OU PROVEITO ECONÔMICO OBTIDO A PARTIR DO VALOR DO CRÉDITO CEDIDO A PARTE DOS HERDEIROS. IMPOSSIBILIDADE. 1- Ação distribuída em 24/01/2002. Recurso especial interposto em 05/11/2014 e atribuído à Relatora em 25/08/2016. 2- O propósito recursal é definir se, para fins de colação e de partilha de bens, deve ser considerado o valor estimado do crédito resultante da venda do terreno pelo falecido à construtora e posteriormente cedido a parte dos herdeiros ou o valor dos imóveis erguidos sobre o terreno e que foram posteriormente dados em pagamento pela construtora a parte dos herdeiros. 3- O legislador civil estabeleceu critério específico e objetivo para a quantificação do valor do bem para fins de colação, a saber, o valor certo ou estimado do bem, a fim de que a doação não sofra influências de elementos externos de natureza econômica, temporal ou mercadológica que, se porventura existentes, deverão ser experimentados exclusivamente pelo donatário, não impactando o acertamento igualitário da legítima, de modo que não é possível substituir o critério legal pelo proveito ou benefício econômico representado por imóveis obtidos a partir do crédito cedido. 4- Na hipótese, o valor do crédito recebido pelo autor da herança em decorrência da venda de terreno à construtora, posteriormente cedido a parte dos herdeiros, deve ser levado à colação pelo seu valor estimado e não pelo proveito ou pelo benefício econômico representado pelos bens imóveis posteriormente escriturados em nome dos cessionários do referido crédito. 5- Recurso especial conhecido e provido. (STJ – REsp: 1713098 RS 2015/0207361-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 14/05/2019, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2019)

Conclusão

O planejamento sucessório é uma excelente estratégia para que tanto o doador quanto os beneficiários possam ser menos onerados possível.

Por isso, em caso de recebimento de valores em vida, sempre consulte um advogado especialista em sucessões. Ele poderá apresentar um plano eficiente para que a doação seja feita de modo a incidir a menor tributação, além de evitar que o beneficiário seja obrigado a devolver boa parte do recebimento quando da partilha.

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A doação modal pode ser útil no planejamento sucessório?

O planejamento sucessório permite ao planejador escolher o método mais eficiente para o seu caso em concreto, a partir da análise dos bens, direitos e realidade dos herdeiros. Um dos instrumentos disponíveis é a doação modal, espécie de doação que permite ao doador estabelecer encargos e deveres ao donatário como forma de concretizar a doação. Este tipo de doação pode, inclusive, abranger a doação das cotas da holding familiar.

O que é a doação modal?

A doação modal está prevista no art. 563 do Código Civil, artigo que determina que “o donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral”. Na prática, o dono do bem realiza a doação sob a condição de que o beneficiário cumpra algum encargo ou incumbência, como o pagamento dos tributos da doação, por exemplo. Outro ponto importante é que, caso o donatário não cumpra a incumbência estabelecida, o doador poderá revogar a doação. Além disso, o encargo da doação não poderá ultrapassar o valor do bem doado, tampouco ser estabelecido em obrigação não mensurada economicamente, sob pena de declaração de nulidade. No entanto, a doação modal pode significar o adiantamento da herança, razão pela qual haverá a dupla tributação nos casos em que o bem doado for bem imóvel. Neste caso, haverá a cobrança de ITBI e ITCMD.

Vale ressaltar que os bens doados em vida devem respeitar a cota de herança de cada herdeiro, sob pena de nulidade posterior.

Qual a diferença entre doação modal e doação com reserva de usufruto?

Dada a semelhança das modalidades de doação, é comum a confusão entre a doação modal e a reserva com cláusula de usufruto. Enquanto a doação modal é feita sob a condição de cumprimento de exigências pelo doador, a doação com reserva de usufruto prevê que o doador tenha o direito de usufruir do bem doado até o fim de sua vida – ou por outro período estabelecido. Com isso, a diferença é que a cláusula com reserva de usufruto não exige do beneficiário qualquer cumprimento de exigência e, portanto, não é possível a reversão da doação, questão permitida pela doação modal.

O que diz a jurisprudência?

A condição imposta para doação deve ser determinada em contrato, principalmente no que se refere aos prazos de cumprimento. O STJ, inclusive, já decidiu que, caso o prazo não conste em contrato, é possível que o doador notifique o donatário para que este tenha tempo hábil de cumprir antes de ser revogada a doação.

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DOAÇÃO COM ENCARGO. REVOGAÇÃO. CONSTITUIÇÃO EM MORA DO DONATÁRIO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. SUFICIÊNCIA. 1. Controvérsia acerca da correta interpretação do art. 562 do Código Civil, notadamente a possibilidade da utilização da notificação extrajudicial para constituir em mora o donatário acerca do descumprimento do encargo no contrato de doação modal em que não há previsão de prazo para o cumprimento da obrigação. 2. A inexecução do encargo assumido pelo donatário em face do doador como condição para a celebração da doação onerosa poderá ensejar a sua revogação. 3. Não previsto prazo determinado para o cumprimento da contraprestação, o doador, mediante notificação judicial ou extrajudicial, na forma do art. 397 do CCB, pode constituir em mora o donatário, fixando-lhe prazo para a execução do encargo, e, restando este inerte, ter-se-á por revogada a doação. 4. Doutrina acerca do tema. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (REsp n. 1.622.377/MG, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 11/12/2018, DJe de 14/12/2018.)

Conclusão

A doação modal é um instrumento que garante maior controle dos bens pelo doador. No entanto, é necessária uma análise apurada de todo o contexto para que não haja a dupla tributação da operação.

Por isso, consulte um advogado especialista em Planejamento Sucessório e verifique se esta modalidade é a melhor saída para o seu caso em concreto.

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Certidão de imunidade de ITBI para imóveis transferidos para a holding familiar

Dentro do planejamento sucessório, a criação de uma holding familiar é uma das alternativas para a transmissão dos bens ainda em vida. Aqui no blog já falamos sobre as vantagens da formação de uma empresa deste tipo para transferir os bens aos herdeiros. No entanto, um dos assuntos mais polêmicos dentro da criação de uma holding para fins sucessórios é a incidência de ITBI quando da transferência de imóveis em nome do proprietário para a empresa. Neste artigo falaremos sobre os principais aspectos deste tema. Acompanhe!

O que é ITBI?

O ITBI é o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, que incide nas relações de transferência de um bem imóvel de um dono para o outro. O ITBI é cobrado pelos municípios, por isso, a alíquota é determinada por estes órgãos da federação.

Como o ITBI pode incidir na transferência dos imóveis para a holding?

Como há a transferência de um bem imóvel, que deixa de ser do dono da empresa para ser da empresa propriamente dita, em tese, há a incidência do tributo. No entanto, a Constituição Federal prevê a imunidade tributária para a integralização do capital social de empresas que não sejam do ramo imobiliário.

Assim, de acordo com o art. 156, § 2º, I da Constituição Federal, não será tributada a transferência de bens imóveis quando a transmissão ocorrer para a integralização do capital social de uma empresa. Vale ressaltar que, para ser válida a imunidade, a atividade principal da empresa deve ser diversa de atividade imobiliária. No entanto, a polêmica reside a partir de uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (RE 796376 SC). No caso em questão, uma empresa com capital social de R$ 24 mil transferiu 17 imóveis, que totalizavam o valor de R$ 802 mil. Esta ação serviu para a integralização do capital social, e a diferença teve o propósito de aumentar o capital da empresa. Porém, a prefeitura da sede da companhia contestou o ato e decidiu que sobre a diferença dos valores dos bens e do capital social deveria haver a incidência de ITBI. O caso foi para a justiça e o STF acabou por decidir que a imunidade à qual o art. 156, § 2º, I da Constituição Federal se refere diz respeito à transferência para o capital social e não para o capital da empresa, ainda que não haja diferenciação entre os termos na letra da norma. Esta decisão se torna contraditória, já que o STF acabou por estender o alcance da lei, que não diferenciou o capital mencionado entre capital social e reserva de capital.

E como essa decisão poderá afetar as holdings familiares?

Como uma holding familiar tem como um dos propósitos diminuir as custas na transmissão dos bens entre proprietário e herdeiros, esta decisão do Supremo poderá afetar de forma negativa a transferência dos bens imóveis à empresa. No entanto, uma das possíveis soluções é ajustar o valor do capital social ao valor dos bens imóveis da família.

Outro ponto importante é o cuidado sobre o valor declarado do bem que está sendo utilizado para integralizar o capital social. Algumas prefeituras, ao receber a requisição de imunidade, têm contestado o valor declarado e requerido a correção para o valor de mercado, o que acaba por alterar o valor da imunidade. Por isso, deve haver um trabalho detalhado entre os responsáveis pela empresa e os contadores para que a constituição e integralização do capital social sejam feitas de forma correta, no intuito de evitar possíveis alegações de fraude e, principalmente, a contestação sobre a imunidade tributária.

O que diz a jurisprudência?

Conforme dito anteriormente, alguns municípios têm contestado a declaração dos valores dos imóveis utilizados para integralização do capital social das empresas. Em um julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, uma empresa integralizou o seu capital social com 9 imóveis que, em sua declaração, custavam cerca de R$ 100 mil. No entanto, o município contestou a declaração, informando que estes imóveis custavam, na verdade, três vezes mais do que o declarado. Assim, a decisão do Tribunal foi pela incidência de ITBI sobre a diferença dos valores. Vejamos.

APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. ITBI. INCORPORAÇÃO DE CAPITAL. IMUNIDADE. VALORES IRRISÓRIOS. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DO IMPOSTO PELO VALOR EXCEDENTE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Conforme, art. 150, II, da CRFB, o fato gerador do ITBI consiste na transmissão onerosa, entre vivos, de direitos reais sobre imóveis. A Constituição Federal, no entanto, prevê a imunidade do tributo em relação à transmissão de bens decorrentes de incorporação de capital, desde que a atividade preponderante do contribuinte não seja a compra e venda desses imóveis, ou sua locação, ex vi art. 156, § 2º, I, da CRFB. Cuida-se de garantia constitucional que visa a facilitar a livre iniciativa empresarial. Todavia, como qualquer norma, não permite a incidência de abuso de direito. Conforme documentos de fls. 35/41 do processo de origem, o impetrante pretende integralizar o capital social da sociedade empresária por meio de 9 imóveis situados no Município de Niterói, declarando valores aproximados de R$ 10.000,00 por imóvel, com exceção do bem localizado no bairro de Icaraí, cujo valor declarado é de aproximadamente R$ 300.000,00. Note-se que tais quantias são notoriamente irrisórias frente ao verdadeiro valor de mercado dos bens. Nesse diapasão, verifica-se a intenção de integralizar o capital social da sociedade com imóveis que possuem valores substancialmente superiores ao declarado no contrato social, o que pode ensejar em simulação ou fraude. Sendo assim, viável a interpretação teleológica da imunidade prevista no art. 156, § 2º, I, no sentido de abarcar o ITBI incidente somente quanto ao valor declarado pelo contribuinte. A questão encontra-se com repercussão geral reconhecida no RE nº. 796.376/SC, sem início de julgamento, mas com parecer favorável do PGR pela incidência do tributo no que o valor do imóvel exceder à quantia a ser integralizada no capital social. Desta forma, não se vislumbra a existência de direito líquido e certo a fundamentar a concessão da ordem. Recurso desprovido. (TJ-RJ – APL: 00474650 420178190002, Relator: Des(a). RENATA MACHADO COTTA, Data de Julgamento: 09/03/2020, TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 17/03/2020)

Conclusão

A imunidade tributária na transferência de bens imóveis pode ser uma boa alternativa para a criação das holdings familiares. No entanto, é preciso muita atenção quanto ao valor declarado no valor do capital social.

Por isso, em caso de dúvidas, consulte um advogado!

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O inventário só tem investimentos. Como é calculado o imposto? Qual é a base de cálculo?

Um processo de inventário costuma levar um tempo considerável em razão da quantidade de bens que o falecido pode deixar, o que gera a necessidade de levantamento de documentação comprobatória e todos os demais passos necessários para o processo.

No entanto, é possível que, em vida, o de cujus tenha optado por deixar rendimentos somente em investimentos. Neste caso, como será calculado o imposto por transmissão? Outro aspecto importante: qual é a base de cálculo a ser utilizada: o valor dos investimentos no dia da morte ou da data da abertura do inventário?

Tais dúvidas são comuns em razão da volatilidade dos investimentos, que têm seus valores variados conforme os ânimos da Bolsa de Valores.

A resposta para tais questões é: independente se os bens deixados foram exclusivamente compostos por investimentos ou se existem bens móveis e imóveis, os impostos são calculados de acordo com o valor venal do bem ou, caso seja dinheiro em espécie, será o valor total do montante.

Agora, a questão que fica é: qual é o valor venal de investimentos? Grande parte dos estados tem adotado o entendimento de que a base de cálculo para tributação de investimentos é o valor das aplicações na data do falecimento do de cujus.

A utilização do valor dos investimentos na data do falecimento implica na seguinte questão: em caso de valorização ou desvalorização destas aplicações no decorrer do inventário, o valor de recolhimento do tributo continua o mesmo. Em outras palavras, se na data da morte do de cujus os investimentos valiam R$ 500 mil e, ao final do processo, que é quando há a partilha entre os herdeiros, tais aplicações passaram a valer R$ 750 mil, o valor do imposto a ser recolhido será calculado sobre os R$ 500 mil, e não sobre o novo valor.

O que diz a jurisprudência?

Em um recente julgamento do Tribunal de Justiça de São Paulo, os herdeiros, durante o decorrer do inventário, solicitaram o levantamento de valores do espólio para o pagamento de dívidas decorrentes da manutenção das ações e investimentos do de cujus. O juiz, em 2ª instância, concedeu o pedido e permitiu que fossem transferidos os valores aos herdeiros.

Tal decisão, ainda que não se relacione diretamente com o cálculo do imposto, abre precedente para outro aspecto importante dos inventários: a questão do pagamento dos tributos no decorrer do processo. Como os valores costumam ser altos e devem ser pagos pelos herdeiros, solicitar o respectivo levantamento no decorrer do processo pode facilitar a vida dos sucessores. Vejamos.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO PEDIDO DE LEVANTAMENTO DE VALORES PARA PAGAMENTO DE CONSULTOR PARA REALOCAÇÃO DE INVESTIMENTOS DESPESA REALIZADA COM A FINALIDADE DE CONSERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO.LEVANTAMENTO DE VALORES ADMISSÍVEL – CPC 619, IV INTELIGÊNCIA. RECURSO PROVIDO. 1. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu pedido de levantamento de valores, em inventário. Alega a agravante: a) todos os herdeiros concordaram com o levantamento do valor necessário ao pagamento da última parcela dos honorários do gestor das aplicações financeiras do espólio; b) o falecido deixou elevadas quantias em aplicações financeiras que foram aplicadas com a venda da carteira de ações na bolsa; c) contou com o auxílio para a liquidação da carteira de ações e aplicação dos valores resultantes da venda, bem como, para a renovação das aplicações já́ existentes; g) a inventariante, com a concordância dos demais herdeiros, deverá ser ressarcida mediante saque da respectiva quantia diretamente da conta bancária existente em nome do de cujus; h) requereu a autorização para levantamento de R$ 83.954,98 diretamente das contas existentes no Banco do Brasil em nome do falecido. Requer o provimento do recurso para que seja determinada a expedição de alvará́ para levantamento de R$ 83.954,98 com a ressalva expressa que R$ 32.390,49. Segundo Daniel Amorim Assumpção Neves, “dependerá do consentimento dos herdeiros atos para alienar bens, pagar dívidas e fazer as despesas necessárias com a conservação e o melhoramento dos bens do espólio. Nesse caso, entretanto, é lícito ao juiz, mesmo havendo resistência dos herdeiros, autorizar a realização do ato”. Na hipótese, a contratação de especialista em investimentos cuida-se de despesas necessária à conservação do patrimônio. Não houve impugnação dos herdeiros, sendo adequado o levantamento dos valores para pagamento do profissional e restituição do quanto adiantado pela inventariante. 3. Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, DOU PROVIMENTO ao recurso para autorizar o levantamento de R$ 83.954,98.

Conclusão

O conhecimento e ciência dos herdeiros sobre os bens deixados pelo falecido é de suma importância, já que possibilita a eles realizar o cálculo dos impostos e a respectiva reserva de valores paga durante a ação do inventário.

Por isso, o planejamento sucessório com advogados qualificados pode auxiliar este processo!