A violência doméstica é um problema presente na sociedade brasileira. E esse quadro se agravou com a pandemia do Covid-19, pois obrigou às vítimas a passarem 24h do tempo com seus agressores.
As consequências para a mulher agredida são muitas. E uma delas é o seu afastamento das atividades habituais, como o trabalho.
Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região concedeu o direito ao recebimento de auxílio-acidente a uma mulher que ficou cega após sofrer agressões do marido.
Neste artigo falaremos sobre os principais aspectos deste benefício e como é possível ter acesso a ele. Acompanhe!
Quais são os requisitos para a concessão do auxílio-acidente?
Segundo a Lei n. 8.213/91, o auxílio-acidente é devido ao segurado do INSS que, em decorrência de algum acidente de qualquer natureza, após a consolidação das lesões, ficou com sequelas que reduziram a sua capacidade laborativa habitual.
Além disso, o segurado deverá cumprir quatro requisitos: ter sofrido um acidente, estar na qualidade de segurado no momento do acidente, tenha sofrido uma redução parcial e definitiva para o seu trabalho habitual e que haja nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade.
Aqui vale ressaltar que este benefício possui caráter indenizatório, isto é, é pago como forma de compensar a perda da capacidade laborativa do segurado.
Como a mulher vítima de violência doméstica pode receber o benefício do INSS?
Entendido quais são os requisitos para concessão do auxílio acidente, se faz necessário entender como a mulher vítima de violência doméstica pode receber este benefício.
Como o pagamento do auxílio acidente é feito para aquele que sofreu algum acidente e teve a diminuição da sua capacidade para o trabalho, se a violência a qual a mulher foi vítima resultar nesta diminuição, ela terá direito.
E isto não poderia ser diferente já que, por exemplo, uma pessoa que foi baleada em razão de um tiroteio, que também é uma forma de violência, e em razão disso ela se sofrer redução na sua capacidade laborativa, ela também poderá receber o auxílio acidente.
O caso julgado pelo TRF-4, considerado um dos mais importantes do assunto, uma mulher foi atacada pelo ex-companheiro com uma muleta, o que resultou na perda da visão do olho esquerdo.
Em razão da deficiência, o tribunal entendeu que seria devido pelo INSS o pagamento do benefício.
E isso vem corroborar com a tese de que, não importa a natureza do acidente, se ele resultar na diminuição da capacidade laborativa do segurado ele terá direito ao auxílio-acidente.
O que diz a jurisprudência?
Uma das questões também já decididas pela jurisprudência é quanto as faltas justificadas da trabalhadora vítima de violência doméstica e o pagamento de auxílio doença pelo período em que a mulher esteve afastada.
Em uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, o STJ entendeu que é dever do INSS pagar auxílio doença para mulher que esteve afastada do trabalho em razão de violência doméstica. Vejamos.
RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO EMPREGO. MANUTENÇÃO DO VÍNCULO TRABALHISTA. COMPETÊNCIA. VARA ESPECIALIZADA. VARA CRIMINAL. NATUREZA JURÍDICA DO AFASTAMENTO. INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PAGAMENTO. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. FALTA JUSTIFICADA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO. AUXÍLIO DOENÇA. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARCIALMENTE. 1. Tem competência o juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade o juízo criminal, para apreciar pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista, por até seis meses, em razão de afastamento do trabalho de ofendida decorrente de violência doméstica e familiar, uma vez que o motivo do afastamento não advém de relação de trabalho, mas de situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher. 2. Tem direito ao recebimento de salário a vítima de violência doméstica e familiar que teve como medida protetiva imposta ao empregador a manutenção de vínculo trabalhista em decorrência de afastamento do emprego por situação de violência doméstica e familiar, ante o fato de a natureza jurídica do afastamento ser a interrupção do contrato de trabalho, por meio de interpretação teleológica da Lei n. 11.340/2006. 3. Incide o auxílio-doença, diante da falta de previsão legal, referente ao período de afastamento do trabalho, quando reconhecida ser decorrente de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher e deve ser equiparada aos casos de doença da segurada, por meio de interpretação extensiva da Lei Maria da Penha. 4. Cabe ao empregador o pagamento dos quinze primeiros dias de afastamento da empregada vítima de violência doméstica e familiar e fica a cargo do INSS o pagamento do restante do período de afastamento estabelecido pelo juiz, com necessidade de apresentação de atestado que confirme estar a ofendida incapacitada para o trabalho e desde que haja aprovação do afastamento pela perícia do INSS, por incidência do auxílio-doença, aplicado ao caso por meio de interpretação analógica. 5. Recurso especial parcialmente provido, para a fim de declarar competente o Juízo da 2ª Vara Criminal de Marília-SP, que fixou as medidas protetivas a favor da ora recorrente, para apreciação do pedido retroativo de reconhecimento do afastamento de trabalho decorrente de violência doméstica, nos termos do voto. (STJ – REsp: 1757775 SP 2018/0193975-8, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 20/08/2019, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/09/2019)
Conclusão
Sendo os critérios para concessão de auxílio acidente, auxílio doença e aposentadoria por incapacidade objetivos, de modo que, não é exigido um modo específico para o acometimento da doença ou incapacidade, é possível que as mulheres vítimas de violência doméstica possam requerer tais benefícios.
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