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Herança digital: Quando eu falecer, não gostaria que as minhas redes sociais fossem acessadas, mas que fossem excluídas. Como posso fazer?

Foi-se o tempo em que o patrimônio de uma pessoa era medido pelos valores depositados em banco, pelos imóveis ou pelas empresas que ela possuía. Atualmente, uma série de bens incorpóreos se tornaram objeto de herança. E um deles são os bens virtuais deixados pelo falecido, como as fotos, e-mails, e-books, assinaturas digitais e contas em redes sociais.

A respeito deste último bem, muitas pessoas possuem dúvidas a respeito de como serão tratadas as contas nestes sites e aplicativos.

Neste artigo trataremos sobre os principais aspectos do assunto. Acompanhe!

O que a legislação tem a dizer sobre a sucessão das redes sociais do falecido?

Atualmente, o Brasil não possui qualquer legislação a respeito da transmissão de herança digital. As questões sobre o tema têm sido orientadas pelos entendimentos jurisprudenciais. No geral, a jurisprudência tem entendido que os bens digitais deixados pelo falecido são de caráter personalíssimo, isto é, só podem ser acessados e usufruídos pelos seus titulares. Deste modo, com a morte do proprietário destes bens, os objetos devem ser descartados, a menos que haja alguma disposição em contrário em testamento deixado pelo falecido para o caso de e-books, fotos e outros bens que não sejam dotados de caráter personalíssimo.

Quanto às redes sociais, estes são bens que não possuem um valor econômico, já que a utilização é feita de forma gratuita. A jurisprudência brasileira não a considera como herança digital, embora algumas contas possam ser revestidas de certo valor econômico, como é o caso dos perfis com milhões de seguidores. Neste caso, a regra que vale é a disposta nos Termos e Condições de Uso do site.

A rede social mais usada do mundo, o Facebook, é a rede que dispõe de regras mais completas sobre o assunto. Os usuários da rede têm a opção de indicar um “contato herdeiro” da conta. Na prática, a pessoa indicada poderá tomar conta do perfil após a morte do titular. Porém, tomar conta significa que este herdeiro poderá optar por transformar o perfil em memorial ou encerrá-lo.

Nas demais redes sociais, incluindo o Facebook, na hipótese de não ser designado um herdeiro, após a morte do titular da conta qualquer pessoa poderá entrar em contato com a rede (seja ela o Instagram, Twitter, LinkedIn, etc.) e informar o falecimento do sujeito. No contato feito, a rede solicitará alguns documentos que atestem o falecimento do titular e outros documentos, que variam conforme a rede. Após o contato, o site encerrará a conta. E isso ocorre pela pessoalidade destes sites, que são orientados por regras rígidas a respeito de dados pessoais.

O que diz a jurisprudência?

Uma das questões importantes que devem ser levadas em consideração, tanto pelo titular da conta quanto pelos seus familiares, são os termos e condições da rede social utilizada.

Em uma decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, os familiares de uma mulher falecida desejaram continuar administrando a sua conta do Facebook, mesmo após o seu óbito. O Tribunal entendeu que, em razão de a rede social prever que, com a morte do titular, a conta deve ser encerrada ou transformada em memorial, não seria possível que os familiares recebessem a conta como herança. Vejamos.

Ação de obrigação de fazer e indenização por danos morais. Sentença de improcedência. Exclusão de perfil da filha da autora de rede social (Facebook) após sua morte. Questão disciplinada pelos termos de uso da plataforma, aos quais a usuária aderiu em vida. Termos de serviço que não padecem de qualquer ilegalidade ou abusividade nos pontos analisados. Possibilidade de o usuário optar pelo apagamento dos dados ou por transformar o perfil em “memorial”, transmitindo ou não a sua gestão a terceiros. Inviabilidade, contudo, de manutenção do acesso regular pelos familiares através de usuário e senha da titular falecida, pois a hipótese é vedada pela plataforma. Direito personalíssimo do usuário, não se transmitindo por herança no caso dos autos, eis que ausente qualquer conteúdo patrimonial dele oriundo. Ausência de ilicitude na conduta da apelada a ensejar responsabilização ou dano moral indenizável. Manutenção da sentença. Recurso não provido. (TJ-SP – AC: 11196886620198260100 SP 1119688-66.2019.8.26.0100, Relator: Francisco Casconi, Data de Julgamento: 09/03/2021, 31ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/03/2021)

Conclusão

O assunto herança digital ainda é muito recente para o Direito, e as regras aplicáveis ainda são desconhecidas pela maioria das pessoas.

Se você possui dúvidas no assunto, converse com um advogado!

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Holding Familiar protege bens em caso de divórcio?

A constituição de uma holding familiar é uma alternativa para o planejamento sucessório, mas também para a proteção dos bens de uma família. E quando se fala em divórcio, é comum pensar que o patrimônio das partes poderá ser afetado.

Mas, o que ocorre se as partes, sócias da holding familiar, se divorciarem? Existe algum prejuízo para a empresa? A resposta é que depende. Neste artigo falaremos sobre os principais aspectos deste assunto. Acompanhe!

O que acontece se houver divórcio entre os constituintes da holding?

É muito comum que uma holding familiar seja criada em nome do patriarca e da matriarca da família, já que o patrimônio das partes é o que será transferido aos seus herdeiros.

Primeiro, nos termos do art. 977 do Código Civil, só será possível a criação de empresa entre um casal se este for casado no regime de comunhão parcial de bens, separação de bens e comunhão final de aquestos. Em caso de regime de comunhão universal e separação obrigatória, o ordenamento jurídico veda a constituição de uma empresa entre o casal.

Pois bem. Caso os constituintes da holding familiar venham a se divorciar, a existência da empresa dependerá se as cotas já tiverem sido transferidas aos herdeiros.

Na hipótese de já haver a doação, não há o que se falar em venda ou dissolução da empresa, já que os sócios é que irão determinar a venda ou não.

No entanto, caso as cotas ainda estejam em nome do casal, será possível traçar dois caminhos:  manter a sociedade como está, com a posterior transferência das partes aos herdeiros ou, caso o antigo casal queira reaver seus bens, dividir as cotas entre eles, a partir de uma ação de apuração de haveres.

Com isso, uma das partes poderá continuar com a empresa e a outra irá receber a sua parte em espécie, a partir da venda de suas cotas, ou se manterão sócias, de modo a ter dissolvida a relação matrimonial, porém ser mantida a relação societária.

O que se verifica é que a continuidade da empresa dependerá de um acordo entre as partes. Caso consigam manter uma boa relação, o ideal é que se mantenha a empresa, realizem a transferência das cotas aos herdeiros e, posteriormente, realizem a reserva de usufruto e administração dos bens que desejarem.

Por exemplo, se um casal possui quatro casas e dois carros, podem criar a holding familiar e transferir estes bens à empresa, depois, posteriormente, doar as cotas aos herdeiros. Assim, em eventual divórcio, poderão colocar uma cláusula de usufruto das duas casas e de um carro ao patriarca e de duas casas e um carro à matriarca, de modo a permitir o acesso aos bens mesmo após o divórcio e mantendo o propósito da transmissão de bens.

E se um dos herdeiros das cotas for casado e se divorciar?

Caso os herdeiros sejam casados e recebam as cotas da holding dos seus pais, a preocupação é que, em eventual divórcio do herdeiro, o ex-cônjuge deseje parte destas cotas e torne ineficaz todo o planejamento sucessório.

Por isso, um dos cuidados a serem tomados neste processo de transferência é a inserção de uma cláusula de incomunicabilidade, inalienabilidade e impenhorabilidade. Assim, em eventual divórcio do herdeiro, não será possível a divisão de sua cota na empresa com seu ex-cônjuge.

Caso a doação da cota não seja feita mediante a inserção desta cláusula, a holding familiar correrá um sério risco de ser transmitida, em parte, ao ex-marido ou ex-esposa do herdeiro.

O que diz a jurisprudência?

Quando a holding familiar é criada e as cotas da sociedade ainda não foram transferidas aos herdeiros, continuam sendo dos sócios que as constituíram, no caso, o patriarca ou matriarca da família.

Assim, em eventual divórcio do casal, caso as partes não pretendam continuar sócias da empresa, a depender do regime de casamento, deverão reaver suas cotas. Para isso, após o trânsito em julgado do divórcio, deverão iniciar uma ação de apuração de haveres, que tem por objetivo verificar o valor constante na empresa e, a partir daí, realizar a divisão das cotas entre o antigo casal.

Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou uma ação neste sentido que ilustra bem esta questão. Vejamos:

AÇÃO DE APURAÇÃO DE HAVERES – EX-CÔNJUGE DE SÓCIO QUE PRETENDE RECEBER SEUS HAVERES NA SOCIEDADE (EIRELI) – PROCEDÊNCIA DO PEDIDO – Empresa constituída na constância do casamento – Separação de fato que se deu em 02/05/2014, data a ser considerada como data da resolução – Autora que faz jus à apuração dos haveres, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução – LEGITIMIDADE ATIVA DE PARTE – A apuração dos haveres deve se dar fora dos autos da ação de divórcio, nos termos do art. 600, CPC. Tanto assim que na ação de divórcio ficou assentado que o pagamento pelas quotas sociais da empresa deve se dar por meio de “ação própria” – PREJUDICIALIDADE EXTERNA – INOCORRÊNCIA – Não há que se falar em suspensão do processo por prejudicialidade externa – Além de já ter havido trânsito em julgado (no capítulo relativo ao divórcio e necessidade de apuração de haveres na SSK GUARNIERI), o recurso especial interposto por SERGIO GUARNIERI não tem efeito suspensivo – Inaplicabilidade do disposto no art. 313, V, a, CPC – CORREÇÃO MONETÁRIA – A atualização monetária não constitui acréscimo, mas mera recomposição do valor da moeda, e que deve retratar o montante devido na data base fixada para a apuração dos haveres (art. 608, parágrafo único, do CPC)– JUROS DE MORA – Juros de mora que somente são devidos após liquidados os haveres e, intimada, a empresa ré não efetuar o pagamento do montante devido (mora ex re) (arts. 397 c.c. art. 1.031, § 2º, CC) – Acolhimento do recurso nessa parte – Sentença parcialmente reformada – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-SP – AC: 10350206520198260100 SP 1035020-65.2019.8.26.0100, Relator: Sérgio Shimura, Data de Julgamento: 02/02/2021, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 03/02/2021)

Conclusão

O cuidado no processo de transmissão de bens aos herdeiros deve ser grande, pois somente a partir de um documento em que estejam previstas inúmeras situações é possível tornar o planejamento sucessório eficaz.

Por isso, em caso de dúvidas neste processo, consulte um advogado!

 

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Título de renda fixa, em caso de falecimento do titular como se faz a partilha? Com quem fica a custódia?

O processo de inventário pode se tornar dispendioso quando há conflito entre os herdeiros sobre a divisão dos bens. No entanto, esta não é a única causa que pode justificar a demora na partilha de bens do falecido. O desconhecimento sobre os passos a serem seguidos quando da existência de certos bens pode fazer com que os herdeiros gastem muito tempo no inventário.

Um exemplo de bens que gera dúvidas entre os herdeiros é o investimento do tipo título de renda fixa. Por não ser exatamente um dinheiro que permanece em conta e por possuir regras específicas para o saque, ele pode confundir os herdeiros.

Os títulos de renda fixa são investimentos em que o titular, ao comprá-los, já sabe qual é o índice de rendimento, tendo uma data pré-fixada para o seu saque. Um exemplo deste tipo de título é o Tesouro Direito, título vendido pelo Governo Federal e que possui taxas de investimento consideradas atrativas para diversos perfis de investidores.

Mas como proceder em caso de falecimento do titular?

O primeiro passo a ser tomado é informar à corretora/banco/cooperativa, ou seja, à instituição financeira que intermedia os investimentos, sobre a morte do detentor do investimento. O procedimento para informação depende do início do processo de inventário, ou seja, enquanto não se iniciar o processo em questão, não será possível o desbloqueio das contas e nem o levantamento dos valores pelo inventariante.

Iniciado o processo, o inventariante deverá encaminhar à instituição financeira que abriga os investimentos do de cujus cópia do atestado de óbito, a decisão judicial que nomeou o inventariante e os documentos pessoais do referido.

Tal passo é essencial para que a instituição realize o bloqueio das contas de investimento, e o inventariante poderá ter acesso à quantia contida na conta, no entanto, não poderá movimentá-la. Além disso, o juiz pedirá à corretora/banco/cooperativa que emita um extrato destas contas e o valor destes investimentos entrarão para o rol de bens do de cujus.

Os títulos continuarão sendo rentabilizados enquanto decorrer o processo de inventário?

Sim, enquanto correr o processo de inventário, os investimentos continuarão rendendo, nos termos do que foi contratado pelo titular.

Vale ressaltar que, durante o processo de inventário, os títulos de renda fixa ficarão sob custódia da instituição financeira, não podendo o inventariante e nem os demais herdeiros movimentá-la.

Findo o processo de inventário, os herdeiros deverão buscar a instituição financeira de posse do formal de partilha e, a partir daí, poderão solicitar a transferência dos ativos para suas respectivas contas ou solicitar o saque do saldo destes investimentos, sendo responsabilidade da instituição a referida transação.

Independente da escolha dos herdeiros, os títulos de renda fixa não poderão permanecer na custódia da instituição financeira após a partilha, tampouco em nome do falecido, devendo ser transferida de imediato aos herdeiros.

O que diz a jurisprudência?

Um dos pontos importantes quanto ao inventário de bens e a existência de investimentos é a possibilidade de resgate destes investimentos sem o processo de inventário. Para que isto ocorra, é necessário que o de cujus não tenha deixado qualquer outro bem a partilhar, de modo que o único bem a ser dividido sejam tais investimentos.

Em um julgamento, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que não seria possível levantar os valores em um investimento de título de capitalização em razão de o falecido ter deixado outros bens a serem inventariados. Vejamos.

APELAÇÃO CÍVEL. ALVARÁ JUDICIAL. LEVANTAMENTO DE SALDO EM CONTA BANCÁRIA REFERENTE A TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO E QUOTA DE CONSÓRCIO. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. EXISTÊNCIA DE BENS A INVENTARIAR. NECESSIDADE DE INVENTÁRIO OU ARROLAMENTO. RECURSO DESPROVIDO. Para o levantamento de saldos bancários e de contas de cadernetas de poupança e fundos de investimento de titularidade do “de cujus”, é requisito a inexistência de outros bens a inventariar. Inteligência do artigo 2º da Lei nº 6.858/8. Precedentes desta Corte. (TJ-SP – AC: 10046091220198260400 SP 1004609-12.2019.8.26.0400, Relator: Maria do Carmo Honório, Data de Julgamento: 26/06/2020, 3ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/06/2020)

Conclusão

Os investimentos deixados pelo de cujus podem causar dúvidas entre os herdeiros quando da partilha, no entanto, é essencial que o processo de inventário se inicie logo para que haja o bloqueio dos ativos.

Vale ressaltar que, quando da transferência dos títulos de renda fixa após o formal de partilha, haverá a incidência de Imposto de Renda e de ITCMD.

Em caso de dúvidas, consulte um advogado!

 

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Bens no exterior podem ser excluídos do testamento?

O assunto testamento, por não ser uma prática difundida no Brasil, costuma gerar inúmeras dúvidas àqueles que desejam saber mais sobre o tema.

E quando o testador possui bens a serem partilhados no exterior, a dúvida que surge é: estes bens devem integrar o rol dos bens do testamento?

Para entender mais sobre essa questão, é preciso verificar o que diz a legislação brasileira.

De antemão, uma das regras dispostas na Lei de Introdução ao Direito Brasileiro é que a jurisdição brasileira só atingirá os bens que estiverem localizados no Brasil, de modo que todo e qualquer bem que estiver localizado no exterior, ainda que seja de propriedade de um brasileiro, seguirá as regras do país em que se encontra.

Tal entendimento é reforçado pelo art. 23 do Código de Processo Civil, que dispõe que, no que se refere à matéria de sucessão hereditária, a autoridade judiciária brasileira tem competência para definir toda e qualquer questão de partilha de bens situados no Brasil.

E como isso se relaciona com os testamentos

Ainda que no testamento o testador possa doar a parte disponível a qualquer pessoa que não seja seu herdeiro necessário, quando os bens estão no exterior, essa regra não se aplica exatamente nestes termos.

Isto porque, aberto o testamento, as regras para a divisão do bem do exterior serão aquelas do país em que ele está localizado, e não as normas do Brasil, ainda que o seu proprietário seja brasileiro.

Por exemplo, caso o de cujus tenha deixado um imóvel em um país em que é obrigatória a divisão entre todos os herdeiros necessários, não sendo possível doar uma quota dos bens a qualquer outra pessoa fora do grupo, o imóvel deverá ser partilhado, então, entre todos os herdeiros necessários.

Por isso, é extremamente necessário que, ao adquirir um bem em outro país, seja consultado um advogado especialista nas regras do país estrangeiro, para que seja feito um testamento nos termos da sua legislação vigente.

O que diz a jurisprudência?

Em 2015, o Superior Tribunal de Justiça julgou um caso interessante. Nele, um casal de alemães deixou um testamento na Alemanha, no qual doava aos seus dois filhos um imóvel no seu país de origem. Após a Segunda Guerra Mundial, a família se mudou para o Brasil, deixando na Alemanha o testamento, sem nenhuma revogação.

Anos se passaram e faleceram os genitores, e antes de ser aberto o inventário do casal, um dos filhos também veio a óbito, deixando o imóvel para a filha sobrevivente. Ela, em posse do testamento, vendeu o bem e utilizou o dinheiro para outros fins.

Os filhos do seu irmão, tendo ciência do caso, iniciaram um processo judicial pleiteando metade do valor do imóvel vendido na Alemanha. No entanto, a decisão do STJ, conforme se extrai a seguir, foi de que o Brasil não possui competência para deliberar sobre bem situado no exterior e, por isso, não seria possível dar provimento ao pedido dos autores. Vejamos.

RECURSO ESPECIAL. DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. AÇÃO DE SONEGADOS PROMOVIDA PELOS NETOS DA AUTORA DA HERANÇA (E ALEGADAMENTE HERDEIROS POR REPRESENTAÇÃO DE SEU PAI, PRÉ-MORTO) EM FACE DA FILHA SOBREVIVENTE DA DE CUJUS, REPUTADA HERDEIRA ÚNICA POR TESTAMENTO CERRADO E CONJUNTIVO FEITO EM 1943, EM MEIO A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, NA ALEMANHA, DESTINADA A SOBREPARTILHAR BEM IMÓVEL SITUADO NAQUELE PAÍS (OU O PRODUTO DE SUA VENDA). 1. LEI DO DOMICÍLIO DO AUTOR DA HERANÇA PARA REGULAR A CORRELATA SUCESSÃO. REGRA QUE COMPORTA EXCEÇÃO. EXISTÊNCIA DE BENS EM ESTADOS DIFERENTES. 2. JURISDIÇÃO BRASILEIRA. NÃO INSTAURAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE DELIBERAR SOBRE BEM SITUADO NO EXTERIOR. ADOÇÃO DO PRINCÍPIO DA PLURALIDADE DOS JUÍZOS SUCESSÓRIOS. 3. EXISTÊNCIA DE IMÓVEL SITUADO NA ALEMANHA, BEM COMO REALIZAÇÃO DE TESTAMENTO NESSE PAÍS. CIRCUNSTÂNCIAS PREVALENTES A DEFINIR A LEX REI SITAE COMO A REGENTE DA SUCESSÃO RELATIVA AO ALUDIDO BEM. APLICAÇÃO. 4. PRETENSÃO DE SOBREPARTILHAR O IMÓVEL SITO NA ALEMANHA OU O PRODUTO DE SUA VENDA. INADMISSIBILIDADE. RECONHECIMENTO, PELA LEI E PELO PODER JUDICIÁRIO ALEMÃO, DA CONDIÇÃO DE HERDEIRA ÚNICA DO BEM. INCORPORAÇÃO AO SEU PATRIMÔNIO JURÍDICO POR DIREITO PRÓPRIO. LEI DO DOMICÍLIO DO DE CUJUS. INAPLICABILIDADE ANTES E DEPOIS DO ENCERRAMENTO DA SUCESSÃO RELACIONADA AO IMÓVEL SITUADO NO EXTERIOR. 5. IMPUTAÇÃO DE MÁ-FÉ DA INVENTARIANTE. INSUBSISTÊNCIA. 6. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.

(STJ – REsp: 1362400 SP 2012/0219242-9, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 28/04/2015, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/06/2015 RSDF vol. 102 p. 45 RT vol. 960 p. 643)

Conclusão

Quando se trata de testamento, as regras podem confundir um pouco quem deseja deixar um documento com todas suas vontades para doação dos seus bens após a morte.

Por isso, caso você tenha bens localizados fora do Brasil, é essencial procurar um advogado especialista em Direito Sucessório do país em que os bens estão situados. Só assim será possível resguardar que a sucessão dos seus bens seja feita de acordo com a sua vontade.

 

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O que é uma empresa cofre? Holding familiar é uma empresa cofre?

Quando se fala em holding familiar, o que se pensa é numa estrutura de empresa. No entanto, como uma empresa poderá auxiliar na gestão do patrimônio e também na sucessão dos bens de uma família, se é responsável por produzir serviços ou produtos e obter lucros?

Isto se deve ao fato de que as holdings familiares são consideradas empresas cofres. Mas você sabe dizer o que significa essa expressão? Neste artigo trataremos sobre as principais regras deste tipo de empresa, para auxiliar você neste processo de escolha. Acompanhe!

O que significa ser uma empresa cofre?

Uma empresa cofre é aquela destinada somente à reunião e guarda dos bens de uma pessoa. Isto significa que a guarda destes bens não será utilizada para a atividade da empresa.

O mais relevante para entender o conceito de empresa cofre é o seguinte: uma empresa com estas características não exerce atividade econômica. É isso o que garante a segurança desses bens, já que toda atividade econômica supõe a presença de riscos e isso pode significar a perda dos bens dos proprietários.

Pense na seguinte situação: alguém que abre um restaurante em uma avenida movimentada de uma grande cidade tem a garantia de que seu estabelecimento nunca irá falir? De antemão, pensar nesta simples suposição nos dá a impressão de que dificilmente um negócio deste porte terá dificuldades em se manter aberto.

Mas, pense: e se surgir uma pandemia? E se abrir um restaurante ainda maior ao lado deste? E se os preços dos alimentos subirem e diminuir o fluxo de pedidos? Como o proprietário poderá arcar com as contas mensais, como salários, aluguéis, tributos, etc.? Com o seu patrimônio, claro.

Deste modo, não existe atividade econômica que não signifique risco para o empresário. É por isso que a holding familiar existe: por ela, seus proprietários não terão qualquer atividade comercial ou industrial, de modo que todo o seu capital estará resguardado de possíveis execuções.

Assim, a partir de uma subscrição e integralização correta, as chances de afetação do patrimônio são mínimas, de modo que as pessoas físicas, enquanto proprietárias, poderão resguardar seus bens ao transferi-los para uma empresa que não possui atividade econômica.

O que diz a jurisprudência?

Recentemente, o TJSP impediu a penhora do bem de uma pessoa que estava sendo executada em razão de este bem ter sido utilizado para integralização do capital social de uma holding patrimonial, outra denominação para empresa cofre.

Abaixo a decisão, que traz de forma bem detalhada o conceito deste tipo de empresa. Vejamos.

EMBARGOS DE TERCEIRO – PENHORA DETERMINADA EM AÇÃO DE EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE – ALEGAÇÃO DE QUE O IMÓVEL EM QUESTÃO, QUE ERA DE PROPRIEDADE DE UM DOS EXECUTADOS, TERIA SIDO REGULARMENTE UTILIZADO PARA INTEGRALIZAÇÃO DE COTAS DA AUTORA EM DATA BEM ANTERIOR À EMISSÃO DAS CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIOS QUE INSTRUEM A EXECUÇÃO – SENTENÇA FORMALMENTE EM ORDEM – SITUAÇÃO DOS AUTOS QUE EVIDENCIA A CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE COMUMENTE DENOMINADA ‘HOLDING PATRIMONIAL’ OU ‘FAMILIAR’, CUJA PERSONALIDADE É DISTINTA DA PERSONALIDADE DE SEUS ACIONISTAS – LEGALIDADE – EXECUTADO QUE SEQUER CONTINUA SENDO COTISTA DA AUTORA – IMPOSSIBILIDADE DE SE ALCANÇAR O IMÓVEL PENHORADO – HIPÓTESE DE ACOLHIMENTO DAS RAZÕES RECURSAIS, PARA DECRETAR A PROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS DE TERCEIRO, INVERTIDOS OS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA – APELO PROVIDO. […] É comum a constituição de empresa denominada ‘holding patrimonial’ ou ‘familiar’, cujo objetivo principal é justamente o controle do patrimônio de uma ou mais pessoas físicas que em vez de possuírem bens em seus próprios nomes, passam a possui-los em nome da sociedade constituída. […] E, no caso de sucessão por morte do acionista, a sucessão será feita apenas por suas cotas na referida sociedade. Isso sem falar que o imposto devido, no caso de venda dos imóveis, será sensivelmente menor. A pessoa física, por sua vez, ao invés de ser detentora de diversos imóveis e eventualmente bens móveis, passará a ser detentora somente das quotas ou ações da sociedade, ora denominada holding patrimonial. Desta forma, gera-se uma segurança maior para o patrimônio da pessoa física. Mas caso os bens sejam de propriedade da holding patrimonial, eles poderão ser livremente transferidos a terceiros, mediante apresentação da CND somente da sociedade. No caso de sucessão, somente as quotas e/ou ações do sucedido são arroladas no inventário, facilitando, inclusive, seu processamento. E ainda, a sociedade a ser constituída, para ser detentora de patrimônio, não traz maiores despesas. Isto porque a holding patrimonial não desempenhará qualquer atividade, não emitirá nota fiscal, não será inscrita no Município e nem no Estado e sua contabilidade se restringirá, a princípio, no envio de uma declaração anual de inatividade para a Receita Federal. Neste contexto, conclui-se que as vantagens são relevantes para diretores e sócios que querem proteger o patrimônio. (TJ-SP – AC: 10013680420178260011 SP 1001368-04.2017.8.26.0011, Relator: Jacob Valente, Data de Julgamento: 14/03/2019, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 14/03/2019)

Conclusão

O conceito de empresa cofre auxilia aqueles que desejam proteger o seu patrimônio e também os que desejam facilitar a transmissão de bens após a morte.

Por isso, em caso de dúvidas, consulte um advogado.

 

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Pacto antenupcial para a proteção patrimonial

Sabia que é possível proteger o seu patrimônio mesmo com o casamento? O pacto antenupcial para a proteção patrimonial é a resposta que muitas pessoas procuram para contrair matrimônio de forma muito mais segura.

Nesse artigo vamos falar sobre o conceito de pacto antenupcial, comentar sobre os seus benefícios e suas consequências. Descubra como essa pactuação pode proteger o seu patrimônio.  

O que é o pacto antenupcial?

O pacto antenupcial para a proteção patrimonial nada mais é do que um contrato celebrado pelas partes antes do casamento, no qual as partes determinam as regras que serão aplicáveis ao matrimônio. Muitas pessoas acreditam que ele é voltado apenas a casamentos que envolvem grandes patrimônios. Mas, a verdade é que qualquer pessoa pode se utilizar do pacto antenupcial, tendo em vista os seus benefícios.

Benefícios do pacto antenupcial

As pessoas que se casam se submetem a um regime de bens, que pode ser escolhido pelas partes ou determinado pela lei, em algumas exceções. Entre os regimes estão o da comunhão parcial de bens, comunhão universal e separação de bens. Esses são regimes padrão, que podem ser alterados de acordo com a vontade das partes. Assim, é possível a criação de um regime personalizado, com regras definidas entre os nubentes.

O pacto antenupcial para a proteção patrimonial funciona como um instrumento para a preservação do patrimônio das partes, já que por meio dele é possível determinar como será a administração dos bens. É possível imaginar até a previsão de indenizações financeiras em caso de infidelidade conjugal, o que não existe expressamente nos regimes jurídicos existentes. Também é possível incluir regras extrapatrimoniais, como aquelas relacionadas à convivência, representação como procurador, responsabilidade pelas despesas da casa e muitas outras.

Limitações ao pacto antenupcial

Como é possível notar, o pacto antenupcial para a proteção patrimonial apresenta muitas possibilidades. No entanto, existem algumas limitações, como por exemplo a impossibilidade de regras que gerem desequilíbrio e dependência entre as partes. Além disso, as cláusulas presentes no pacto não podem violar direitos e garantias fundamentais, nem estar em desconformidade com vedações legais.

Com relação à sua forma, o art. 1.653 do Código Civil estabelece que “É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o casamento”.

Pacto antenupcial e divórcio

Com relação ao divórcio, vale a pena destacar que o pacto antenupcial pode ser usado para prever como será a divisão dos bens, criando um regime jurídico próprio, com regras definidas pelas partes. No entanto, existem alguns aspectos do divórcio que não podem ser regulados pelo pacto, como por exemplo a renúncia do direito à guarda dos filhos menores ou ordem sucessória.

Conclusão

Percebe-se que o pacto antenupcial para a proteção patrimonial é um mecanismo muito importante para aqueles que querem se casar com mais segurança e previsibilidade. Esse contrato coloca o poder de decisão, com relação às regras patrimoniais e também as extrapatrimoniais, nas mãos dos nubentes. Dessa forma, é uma alternativa viável a ser considerada.

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O inventário só tem investimentos. Como é calculado o imposto? Qual é a base de cálculo?

Um processo de inventário costuma levar um tempo considerável em razão da quantidade de bens que o falecido pode deixar, o que gera a necessidade de levantamento de documentação comprobatória e todos os demais passos necessários para o processo.

No entanto, é possível que, em vida, o de cujus tenha optado por deixar rendimentos somente em investimentos. Neste caso, como será calculado o imposto por transmissão? Outro aspecto importante: qual é a base de cálculo a ser utilizada: o valor dos investimentos no dia da morte ou da data da abertura do inventário?

Tais dúvidas são comuns em razão da volatilidade dos investimentos, que têm seus valores variados conforme os ânimos da Bolsa de Valores.

A resposta para tais questões é: independente se os bens deixados foram exclusivamente compostos por investimentos ou se existem bens móveis e imóveis, os impostos são calculados de acordo com o valor venal do bem ou, caso seja dinheiro em espécie, será o valor total do montante.

Agora, a questão que fica é: qual é o valor venal de investimentos? Grande parte dos estados tem adotado o entendimento de que a base de cálculo para tributação de investimentos é o valor das aplicações na data do falecimento do de cujus.

A utilização do valor dos investimentos na data do falecimento implica na seguinte questão: em caso de valorização ou desvalorização destas aplicações no decorrer do inventário, o valor de recolhimento do tributo continua o mesmo. Em outras palavras, se na data da morte do de cujus os investimentos valiam R$ 500 mil e, ao final do processo, que é quando há a partilha entre os herdeiros, tais aplicações passaram a valer R$ 750 mil, o valor do imposto a ser recolhido será calculado sobre os R$ 500 mil, e não sobre o novo valor.

O que diz a jurisprudência?

Em um recente julgamento do Tribunal de Justiça de São Paulo, os herdeiros, durante o decorrer do inventário, solicitaram o levantamento de valores do espólio para o pagamento de dívidas decorrentes da manutenção das ações e investimentos do de cujus. O juiz, em 2ª instância, concedeu o pedido e permitiu que fossem transferidos os valores aos herdeiros.

Tal decisão, ainda que não se relacione diretamente com o cálculo do imposto, abre precedente para outro aspecto importante dos inventários: a questão do pagamento dos tributos no decorrer do processo. Como os valores costumam ser altos e devem ser pagos pelos herdeiros, solicitar o respectivo levantamento no decorrer do processo pode facilitar a vida dos sucessores. Vejamos.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO PEDIDO DE LEVANTAMENTO DE VALORES PARA PAGAMENTO DE CONSULTOR PARA REALOCAÇÃO DE INVESTIMENTOS DESPESA REALIZADA COM A FINALIDADE DE CONSERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO.LEVANTAMENTO DE VALORES ADMISSÍVEL – CPC 619, IV INTELIGÊNCIA. RECURSO PROVIDO. 1. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu pedido de levantamento de valores, em inventário. Alega a agravante: a) todos os herdeiros concordaram com o levantamento do valor necessário ao pagamento da última parcela dos honorários do gestor das aplicações financeiras do espólio; b) o falecido deixou elevadas quantias em aplicações financeiras que foram aplicadas com a venda da carteira de ações na bolsa; c) contou com o auxílio para a liquidação da carteira de ações e aplicação dos valores resultantes da venda, bem como, para a renovação das aplicações já́ existentes; g) a inventariante, com a concordância dos demais herdeiros, deverá ser ressarcida mediante saque da respectiva quantia diretamente da conta bancária existente em nome do de cujus; h) requereu a autorização para levantamento de R$ 83.954,98 diretamente das contas existentes no Banco do Brasil em nome do falecido. Requer o provimento do recurso para que seja determinada a expedição de alvará́ para levantamento de R$ 83.954,98 com a ressalva expressa que R$ 32.390,49. Segundo Daniel Amorim Assumpção Neves, “dependerá do consentimento dos herdeiros atos para alienar bens, pagar dívidas e fazer as despesas necessárias com a conservação e o melhoramento dos bens do espólio. Nesse caso, entretanto, é lícito ao juiz, mesmo havendo resistência dos herdeiros, autorizar a realização do ato”. Na hipótese, a contratação de especialista em investimentos cuida-se de despesas necessária à conservação do patrimônio. Não houve impugnação dos herdeiros, sendo adequado o levantamento dos valores para pagamento do profissional e restituição do quanto adiantado pela inventariante. 3. Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, DOU PROVIMENTO ao recurso para autorizar o levantamento de R$ 83.954,98.

Conclusão

O conhecimento e ciência dos herdeiros sobre os bens deixados pelo falecido é de suma importância, já que possibilita a eles realizar o cálculo dos impostos e a respectiva reserva de valores paga durante a ação do inventário.

Por isso, o planejamento sucessório com advogados qualificados pode auxiliar este processo!

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Ações, derivativos, commodities e outros ativos custodiados na B3: O que ocorre em caso de falecimento do titular?

Os investimentos em renda variável são a principal escolha para os investidores de perfil agressivo, afinal, o risco inerente a esta espécie de aplicação pode ser grande e o investidor perder todo o valor aplicado.

No entanto, uma prática comumente utilizada é a compra destes investimentos sem a manutenção ou saque por um grande período, no qual os valores permanecem por muito tempo na instituição financeira, já que uma estratégia neste tipo de aplicação é a retirada após certo prazo para que haja o rendimento do valor investido.

Porém, neste tempo é possível a ocorrência de diversos fatos e, muitas vezes, o investidor acaba falecendo sem incluir tais investimentos no seu testamento ou, ainda, sem informar à família sobre a sua existência.

Assim, a dúvida que surge é: como a família poderá proceder para ter acesso aos investimentos como ações, derivativos e commodities após o falecimento do titular?

Primeiro, para que os herdeiros tenham acesso às ações e demais ativos em custódia da B3 (Bolsa Brasil Balcão, a Bolsa de Valores Brasileira), é preciso que seja iniciado o inventário do titular e que seja nomeado um inventariante.

Vale ressaltar que as ações, os derivativos (espécie de investimento em que os ganhos estão atrelados a outro investimento, seja dólar, juros, etc.) ou commodities (investimento no mercado de matéria-prima essencial), ainda que custodiados pela B3, são administrados por uma corretora de valores mobiliários e é ela quem realizará o bloqueio dos bens quando do falecimento, bem como é para ela que deverão ser entregues os documentos necessários para a emissão do extrato a ser utilizado no inventário.

No geral, os documentos a serem enviados à instituição financeira são: certidão de óbito, decisão judicial que nomeou o inventariante (Termo de Inventariança) e os documentos pessoais do referido. O envio poderá ser por via postal ou de modo eletrônico, a depender da instituição.

Enquanto perdurar o inventário, tais ações ficarão congeladas, de modo que não será possível que os herdeiros, tampouco o inventariante, realizem a movimentação.

Findo o inventário, o inventariante deverá levar à instituição financeira a decisão judicial que determinou a partilha dos ativos, e a corretora realizará a sua transferência ou realizará a liquidação, conforme solicitação das partes.

O que diz a jurisprudência?

Um aspecto relevante nos inventários em que existem ações, derivativos, commodities e outras espécies de investimentos de renda variável e que são custodiados pela Bolsa de Valores (B3) é quanto à declaração destes investimentos e o valor a ser recolhido a título de imposto de transmissão (ITCMD).

Em um recente julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), os inventariantes declararam um valor inferior ao que valiam de fato os investimentos custodiados pela Bolsa de Valores. Na ocasião, a juíza realizou a verificação da divergência através do sítio das bolsas de valores, corretoras e extratos da instituição financeira, desconstituindo a declaração inicial dos herdeiros. Vejamos.

APELAÇÃO CÍVEL. INVENTÁRIO. RECOLHIMENTO DO ITD. AUTO DE INFRAÇÃO QUE APUROU DIFERENÇA ENTRE OS VALORES DECLARADOS E OS VALORES DE MERCADO, DOS BENS INVENTARIADOS. Guia de controle de ITD que é emitida no sítio da Secretaria de Fazenda do Estado e serve para cálculo e lançamento do imposto, na qual são inseridas as informações do inventariado, dos herdeiros, e dos bens e que, posteriormente, será paga por intermédio do documento de arrecadação – Darj. Inteligência da Resolução Sefaz nº 048. Declarações de responsabilidade do contribuinte. Presunção de veracidade dos atos da autoridade fazendária. Conjunto probatório que conduz à divergência entre os valores declarados e a cotação média dos ativos financeiros, na data do fato gerador. Legitimidade do lançamento de oficio dos valores não pagos. Parte autora que não logrou comprovar o direito alegado. Ausência de cerceamento de defesa. Valores e existência do bem que podem ser comprovados através do sítio das bolsas de valores, corretoras e extratos da instituição financeira. Manutenção da sentença. Recurso conhecido e desprovido.

(TJ-RJ – APL: 04875991620148190001, Relator: Des(a). JDS ISABELA PESSANHA CHAGAS, Data de Julgamento: 26/09/2019, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 30/09/2019)

Conclusão

Conhecer os investimentos e bens do de cujus pode facilitar todo o processo de inventário que, no geral, poderá levar certo tempo.

Vale ressaltar que as instituições financeiras que administram os ativos podem ter procedimentos próprios para o bloqueio dos bens e envio do extrato dos ativos. Por isso, é importante que os herdeiros busquem informações diretamente com estas empresas.

Por fim, a realização do inventário com base nas últimas declarações de Imposto de Renda do de cujus pode facilitar a questão do recolhimento dos impostos de transmissão.

Na dúvida, sempre consulte um advogado!

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Quais são as despesas para a manutenção de uma holding familiar?

Aqui no blog já falamos sobre as diversas vantagens em constituir uma holding familiar, seja para fins de sucessão, seja para o controle do patrimônio da família.

No entanto, mesmo diante das inúmeras vantagens, é extremamente relevante conhecer quais são os gastos para a manutenção deste tipo de empresa. Neste artigo trataremos sobre o assunto, no intuito de auxiliar você a se decidir a formar uma holding para proteger os seus bens e de sua família.

Os gastos previstos na manutenção de uma holding familiar

Como a funcionalidade da holding familiar é atuar como uma empresa cofre, isto é, funcionar como um depósito dos bens da família, não existe geração de receitas, como acontece com uma empresa comum.

Assim, os gastos decorrentes de contratação de funcionários, despesas trabalhistas, locação de espaço, entre outros, não estarão presentes no rol de despesas de manutenção. No entanto, isto não significa que os proprietários não terão gastos a serem arcados.

Assim, o que resta de gastos com manutenção são os tributos a serem recolhidos.

Um deles é o decorrente do Imposto de Renda, feito anualmente. Deste modo, além do imposto de renda pago, pode ser necessário ser pago, também, os honorários do contador.

Quanto aos tributos mensais próprios do regime de empresa, a escolha do regime é o que determinará quais impostos deverão ser recolhidos.

Vale ressaltar que é vedado que uma holding familiar seja constituída no regime do Simples Nacional, restando a ela a escolha entre o regime de lucro real e o do lucro presumido, sendo o mais indicado para este tipo de empresa o regime de lucro presumido.

Neste tipo de regime, os tributos a serem pagos são o ISS (Imposto sobre Serviços), PIS (Programa de Integração Social) e COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), estes declarados e recolhidos mensalmente, e o CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), cobrado trimestralmente.

No entanto, estes impostos só incidirão sobre o faturamento da holding, que só acontecerá se ela receber proventos dos seus bens, como aluguéis, por exemplo. Caso contrário, em caso de faturamento 0, não será necessário recolher tais tributos.

O que diz a jurisprudência?

Uma das previsões da Constituição Federal e do Código Tributário Nacional é a possibilidade de isenção tributária no que se refere ao ITBI, quando a integralização do capital social for realizada com imóveis. Como visto, o ITBI pode significar um gasto significativo dentro da holding familiar.

No entanto, recentemente o STJ reforçou um acórdão do TJPR e decidiu que esta isenção não poderia ser aplicada neste tipo de holding. Isto porque a isenção vem servir de auxílio para as empresas produtivas e que geram receita e empregos à sociedade.

No entanto, quando se fala de holding familiar, o propósito deste tipo de empresa é somente resguardar o patrimônio da família, de modo que não é devida a isenção tributária. Vejamos.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.368.243 – PR (2018/0249656-0) Trata-se de agravo interposto contra decisão que inadmitiu recurso especial fundado na alínea a do permissivo constitucional, que desafia acórdão assim ementado: APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. Pretensão de reconhecimento da imunidade tributária de ITBI. Transmissão de imóveis incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital social. Art. 156, 2º, I da CF, regulamentada pelos arts. 36 e 37 do CTN. Empresa que tem como objeto social a participação em outras sociedades (holding) exceto nas de responsabilidade solidária. Documentação que demonstra que a sociedade foi constituída com a finalidade de blindagem patrimonial. Holding familiar que possui o objetivo de centralização e unificação dos bens patrimoniais pertencentes aos sócios. Desvirtuamento da finalidade da imunidade tributária, que visa ao incentivo do desenvolvimento da atividade produtiva, geração de empregos, circulação de riquezas e melhorias sociais. Normas imunizantes que devem ser interpretadas de modo restritivo e finalístico. Impossibilidade de reconhecimento da imunidade tributária no caso. Sentença mantida. Recurso desprovido. […] Ante o exposto, com base no art. 253, parágrafo único, II, a, do RISTJ, CONHEÇO do agravo para NÃO CONHECER do recurso especial. Publique-se. (STJ – AREsp: 1368243 PR 2018/0249656-0, Relator: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Publicação: DJ 06/03/2019)

Conclusão

O que se verifica é que os gastos de manutenção de uma holding familiar são baixos, já que a sua funcionalidade é atuar como uma empresa cofre, de modo a não incidir qualquer outro tipo de receita.

No entanto, em caso de dúvidas, consulte o seu contador ou advogado.

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Cônjuge tem direito à herança? Testamento pode excluir família

As questões concernentes à partilha de bens possuem regras especificas, a depender do modelo da família e do regime de casamento.

Por isso, é comum que surjam dúvidas sobre como se dá a divisão dos bens entre os herdeiros. Neste artigo, traremos dos principais aspectos sobre a herança para o cônjuge e sobre as regras sobre exclusão da família no testamento.

Como funcionam as regras de herança para o cônjuge?

No direito brasileiro, os regimes de casamento determinam as regras de divisão de bens em caso de separação dos cônjuges. No entanto, estas regras não são determinantes em caso de partilha post mortem de um dos cônjuges.

Isto porque o art. 1.829, inciso I do Código Civil, determina que na sucessão legitima os descentes concorrem com o cônjuge sobrevivente, exceto se casado no regime de comunhão universal, em separação obrigatória ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.

Então, a partir deste artigo, tiramos as seguintes disposições: aquele casado em regime de separação obrigatória (hipótese de casamento com maior de 70 anos, quem se casa sem observar as causas suspensivas do casamento e todo aquele que dependa de autorização judicial para casar) não terá direito à herança do cônjuge falecido.

Já o casado em regime de comunhão universal não concorrerá com os descendentes, pois, pelo regime do seu casamento, metade dos bens do falecido já serão seus por direito.

Por fim, aquele casamento em regime de comunhão parcial não concorrerá com os descendentes quando o falecido deixar somente bens adquiridos após o casamento, já que, também neste caso, metade de todos os bens do falecido já são do sobrevivente por direito.

E como funciona esta concorrência com os demais herdeiros?

Para aqueles casados em regimes fora das hipóteses acima elencadas, a divisão dos bens será feita de forma igual entre ele e os demais herdeiros necessários (descendentes ou ascendentes). Por exemplo, homem falece e deixa esposa, com a qual era casado em regime de participação final nos aquestos, três filhos e um patrimônio de R$ 200 mil. Cada descendente, incluindo a esposa, receberá R$ 50 mil.

E em caso de testamento, é possível excluir a família?

Conforme já trouxemos aqui no blog, em caso de testamento, o testador só poderá doar metade dos bens a terceiros que não componham o rol de herdeiros necessários. A outra metade, necessariamente deve ser partilhada entre tais herdeiros (cônjuge, ascendente e descendentes).

Caso este testamento exclua estes herdeiros ou faça doação de quota inferior a 50%, o testamento será considerado nulo.

Existem duas hipóteses em que é possível excluir herdeiros necessários do testamento: em caso de cônjuge que estava separado de fato há mais de dois anos contados da morte do de cujus, ou divorciado/separado judicialmente na data do falecimento.

Já na hipótese de ascendentes e descendentes, estes poderão ser excluídos do testamento caso algum deles tenha proferido ofensa física contra o de cujus, injúria grave, tenha tido relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto (em caso de descendentes) ou mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta (em caso de ascendentes) ou tenha desamparado o de cujus em alienação mental ou grave enfermidade.

Vale ressaltar que o testamento deve conter a causa expressa da deserdação, sob risco de dela ser declarado nulo.

O que diz a jurisprudência?

A seguinte decisão do STJ exemplifica bem a interpretação do Código Civil acerca da sucessão aos cônjuges, independente do regime de casamento. Vejamos.

Recurso especial. Direito das sucessões. Inventário e partilha. Regime de bens. Separação convencional. Pacto antenupcial por escritura pública. Cônjuge sobrevivente. Concorrência na sucessão hereditária com descendentes. Condição de herdeiro. Reconhecimento. Exegese do art. 1.829, i, do CC/02. Avanço no campo sucessório do código civil de 2002. Princípio da vedação ao retrocesso social. 3. O pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional somente dispõe acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de administração no curso do casamento, não produzindo efeitos após a morte por inexistir no ordenamento pátrio previsão de ultratividade do regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao regime matrimonial. 4. O fato gerador no direito sucessório é a morte de um dos cônjuges e não, como cediço no direito de família, a vida em comum. As situações, porquanto distintas, não comportam tratamento homogêneo, à luz do princípio da especificidade, motivo pelo qual a intransmissibilidade patrimonial não se perpetua post mortem. 6. O regime da separação convencional de bens escolhido livremente pelos nubentes à luz do princípio da autonomia de vontade (por meio do pacto antenupcial), não se confunde com o regime da separação legal ou obrigatória de bens, que é imposto de forma cogente pela legislação (art. 1.641 do Código Civil), e no qual efetivamente não há concorrência do cônjuge com o descendente. 7. Aplicação da máxima de hermenêutica de que não pode o intérprete restringir onde a lei não excepcionou, sob pena de violação do dogma da separação dos Poderes (art. 2 da Constituição Federal de 1988). 8. O novo Código Civil, ao ampliar os direitos do cônjuge sobrevivente, assegurou ao casado pela comunhão parcial cota na herança dos bens particulares, ainda que os únicos deixados pelo falecido, direito que pelas mesmas razões deve ser conferido ao casado pela separação convencional, cujo patrimônio é, inexoravelmente, composto somente por acervo particular. 9. Recurso especial não provido. (STJ, RESP 1.472.945, Relator: Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, J. 23/10/2014).

Conclusão

As regras acerca da sucessão entre os cônjuges, em suma, não dependem do regime. No entanto, quanto a isso vimos que cabem exceções.

Caso você tenha dúvidas quanto ao regime sucessório do seu casamento ou sobre as hipóteses de deserdação, procure um advogado!