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Direito Imobiliário

Tenho apenas um contrato de compra e venda. Posso regularizar o imóvel?

Uma frase que toda pessoa que já foi a um cartório de notas leu é a de que “quem não registra não é dono”.

E esta é uma frase correta, afinal, a propriedade é garantida com o registro do imóvel em nome do proprietário.

Mas, seria possível registrar o imóvel apenas com o contrato de compra e venda? A resposta é que sim. A forma que a regularização ocorrerá depende da situação em concreto.

Veja quais são as duas situações mais comuns e como quais são as saídas para cada uma delas.

Contrato de compra e venda com o vendedor vivo

Na hipótese do vendedor e proprietário do imóvel estar vivo, a saída mais indicada é ele e o comprador comparecem no cartório de imóveis e solicitarem a transferência do bem.

Caso o vendedor ou os seus herdeiros se neguem a realizar a transferência da propriedade, a saída será o ingresso na justiça, através de uma ação de adjudicação compulsória.

Nesta ação, o juiz analisará as provas, ouvirá as partes e, casa entenda que o comprador é o proprietário, ele proferirá uma sentença favorável ao comprador.

Esta sentença deverá ser levada ao cartório de registro de imóveis, onde será lavrada escritura em nome do novo proprietário.

Contrato de compra e venda com o vendedor falecido ou desaparecido

Caso o vendedor e proprietário do imóvel ser falecido, existem duas saídas: a transferência do bem pelos herdeiros e a ação de usucapião.

Os herdeiros, em razão do falecimento do vendedor, são considerados proprietários do imóvel e detêm a competência de transferir o bem ao comprador.

Na hipótese de os herdeiros negarem a transferência, é possível também o ingresso da ação de adjudicação compulsória, que ocorrerá nos moldes explicados no item anterior.

Porém, não sendo possível encontrar os herdeiros, a usucapião será a melhor saída.

A usucapião poderá ser solicitada através de uma ação judicial ou ser realizada extrajudicialmente, através de cartório.

O comprador deverá comprovar a posse do imóvel há, no mínimo, 10 anos.

O prazo será de 5 anos, nos casos de imóvel urbano de até 250m2 e que seja o único bem do solicitante.

O contrato de compra e venda é documento indispensável para o processo de usucapião, independente onde ele transcorra.

O que diz a jurisprudência?

O atraso na regularização do imóvel por parte do vendedor pode ser causa de indenização por danos morais ao comprador.

Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu um caso em que o vendedor não cumpriu o acordado para a transferência e regularização do bem.

Com isso, o juiz decidiu pela rescisão do contrato de compra e venda e o pagamento de indenização por danos morais ao comprador. Vejamos.

EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM APELAÇÃO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. LOTEAMENTO. PROBLEMAS ADMINISTRATIVOS DE REGULARIZAÇÃO. RESCISÃO DE CONTRATO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. Acórdão que deu parcial provimento a apelações de ambas as partes. Oposição de embargos de declaração pelas rés. Obscuridade não caracterizada. Indenização por danos morais reconhecida, em razão do atraso na regularização do imóvel do autor e na informação adequada a ser prestada a ele. Endividamento do autor que foi consequência desse atraso. Reforma da sentença, neste ponto, sem obscuridade ou contradição. Ausência de violação ao artigo 141 do CPC. Acórdão mantido. Embargos rejeitados. (TJ-SP – EMBDECCV: 10089581220168260320 SP 1008958-12.2016.8.26.0320, Relator: Carlos Alberto de Salles, Data de Julgamento: 15/05/2018, 3ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/05/2018)

Conclusão

Ainda que a transferência amigável de um imóvel possa ocorrer sem a presença de um advogado, o acompanhamento deste profissional pode ser essencial, visto que ele poderá analisar os documentos da propriedade e indicar possível irregularidades.

No mais, a regularização do imóvel é a maneira mais eficaz do comprador ser considerado proprietário do bem, razão pelo qual ela é altamente recomendável.

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Direito das Sucessões

Imóvel financiado pode fazer parte da holding familiar?

Na constituição de uma holding familiar e na transferência dos bens à sociedade é comum que as partes possuam imóveis em financiamento e que o prazo do pagamento seja demasiado longo.

A partir daí, surge a dúvida se estes imóveis podem integrar a holding, seja na integralização do capital social, seja como aumento do capital.

Inicialmente, é possível responder que é plenamente possível esta transferência. No entanto, existem alguns requisitos que devem ser verificados pelas partes antes da realização do negócio, requisitos estes que serão tratados neste artigo. Acompanhe!

Como realizar a transferência?

A transferência do financiamento, que é da pessoa física e passará a ser da pessoa jurídica, ocorre com a solicitação da transferência da dívida junto ao banco

Vale ressaltar que, quando alguém adquire um bem em financiamento, até que a pessoa quite todas as parcelas o bem é da instituição financeira que realizou o parcelamento. Enquanto o financiamento está em curso, o adquirente do bem é apenas um devedor fiduciante, sendo um possuidor do bem, na qualidade de usuário e depositário.

Deste modo, aquele que deseja transferir o imóvel em financiamento para a holding inicialmente apenas transferirá a dívida, que antes era da pessoa física e passará a ser da pessoa jurídica.

Com isso, em caso de inadimplência pela sociedade, é possível que sejam penhorados os demais bens que estejam em nome da holding.

Destaca-se que esta é a razão pelo qual os bancos aceitem a transferência do financiamento, pois, a pessoa jurídica possui melhores condições de quitar a dívida em comparação à pessoa física.

Além disso, as condições de transferência do financiamento vão depender do que estiver estabelecido no contrato firmado entre a instituição financeira e o adquirente do bem, razão pelo qual é possível que o banco negue o pedido para mudança do devedor. Nesta hipótese, somente através de uma ação judicial é que será possível a transferência da dívida.

Quais são os custos inerentes à transferência?

Concedido o pedido de transferência, é hora de saber quais os custos desta transação. Em primeiro plano, esta transferência é considerada a venda do bem, que deixará de ser de uma pessoa e passará a ser de outra.

A partir daí, o adquirente da dívida deverá arcar com os custos de cartório e registro, com o ITBI (imposto de transmissão de bens imóveis), além das taxas do banco, que a depender da instituição e se a pessoa jurídica era correntista ou não, poderão variar.

Logo, antes de ocorrer tal transferência, é preciso que seja realizado os cálculos da transação, no intuito de evitar surpresas às partes.

Após a realização da transferência da dívida, a holding será considerada possuidora e usuária do bem, ainda que ainda não seja proprietária, status que somente adquirirá após o término do financiamento e da quitação de todas as parcelas.

O que diz a jurisprudência?

Uma das questões a serem verificadas pelos instituidores da holding quando da transferência do financiamento do imóvel à sociedade é o pagamento de ITBI – imposto de transmissão de bens imóveis.

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que quando há a transferência do financiamento fica caracterizada a venda do bem, incidindo o pagamento de ITBI. Vejamos.

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INADIMPLEMENTO DO DEVEDOR FIDUCIANTE. POSSE PLENA DO CREDOR FIDUCIÁRIO. INCIDÊNCIA DE ITBI. OBJETO DA DEMANDA 1. Questiona-se a exigência de imposto sobre transmissão inter vivos – ITBI na venda de imóvel com alienação fiduciária quando há consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário ante o inadimplemento do devedor fiduciante. O FATO GERADOR DO ITBI 2. A Constituição Federal e o Código Tributário Nacional, respectivamente, nos arts. 156 e 35, estabelecem que o fato gerador do ITBI é a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil, bem como a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia e as respectivas cessões de direitos. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – NATUREZA JURÍDICA E FUNCIONAMENTO 3. Nos casos de compra e venda de bem imóvel com pacto de alienação fiduciária, a compra e venda é o negócio jurídico principal e a alienação fiduciária, o pacto acessório voltado à garantia de pagamento do crédito fornecido ao devedor para viabilizar a alienação. 4. Na transferência de imóvel pela compra e pela venda feitas com alienação fiduciária, há incidência do ITBI em razão da compra e venda, mas não há incidência do ITBI sobre o direito real de garantia oriundo do pacto acessório de alienação fiduciária, porquanto legalmente excetuado como hipótese de incidência (art. 156, II, CF; art. 35, II, CTN). Em outras palavras, em operações triangulares, em que existe uma instituição financeira, o vendedor transfere ao comprador a propriedade plena (com incidência do ITBI), e então o comprador, agora devedor fiduciante, entrega ao banco, credor fiduciário, a propriedade fiduciária (nessa operação não há o pagamento do citado tributo, pois se trata de transmissão do direito real de garantia, que é hipótese de exclusão tributária). Em operações diretas, sem intermediação de instituição financeira, o ITBI incide sobre a compra e a venda feitas entre vendedor e comprador e não sobre a constituição da garantia. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE PELO INADIMPLEMENTO DO DEVEDOR FIDUCIANTE – CARACTERIZAÇÃO DO FATO GERADOR DO ITBI NOS TERMOS DO ART. 156 DA CF E 35 DO CTN 5. Hipótese distinta se dá quando a propriedade se consolida em nome do credor fiduciário ante o inadimplemento do devedor fiduciante. Nesse caso ocorre novo fato gerador, nos termos definidos pela CF e pelo CTN, consubstanciado na efetiva transferência do direito real de propriedade, em sua plenitude, em favor do credor. 6. O fato de o credor fiduciário ter a propriedade resolúvel não significa dizer que não há transmissão de propriedade, nem que não ocorre o fato gerador do ITBI. Isso porque a propriedade fiduciária é qualificada como direito real de garantia (art. 1.367 do CC/2002), com regime jurídico correspondente, razão pela qual não há incidência do ITBI na constituição da aludida garantia.  (STJ – REsp: 1837704 DF 2019/0272711-8, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 05/12/2019, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/05/2020)

Conclusão

Ainda que seja possível transferir o financiamento do imóvel da pessoa física para a pessoa jurídica, o imóvel só poderá ser gravado como de propriedade da holding após a quitação das parcelas.

No entanto, é possível que, neste ínterim, seja registrado na junta comercial da cidade em que o bem a holding está sediada que o imóvel compõe o capital da sociedade.

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Direito das Sucessões

Curadoria especial de patrimônio. O que é? Qual a finalidade?

A celebração de um testamento pode ser uma boa opção para aqueles que desejam distribuir seus bens aos herdeiros de forma justa e a seu gosto. Aqui no blog já falamos sobre as diversas vantagens da realização do planejamento sucessório. Vale conferir!

Porém, a distribuição de bens não é o único assunto que pode ser tratamento em um inventário. Um dos institutos previstos no Código Civil é o da curadoria especial. Neste artigo falaremos dos principais aspectos deste assunto. Acompanhe!

O que é a curadoria especial de patrimônio?

A curadoria é a uma previsão do Código Civil que é delegado a um terceiro a administração e cuidados a uma coisa ou pessoa, seja por tempo determinado ou não.

Uma das principais formas de curadoria existentes é a curadoria no caso de incapaz que possui incapacidade transitória e precisa de um representante dos seus atos cíveis. A partir daí, o juiz pode nomear o curador, a partir de pessoa da família ou representante legal.

Assim, a curadoria especial de patrimônio é aquela em que o sujeito estabelece em seu testamento a pessoa que ficará responsável por gerir seu patrimônio enquanto não finalizado o inventário.

Esta nomeação pode ser uma boa opção, já que, quando não há esta previsão testamentária, o juiz é quem nomeia o administrador da herança, de modo que, nem sempre a pessoa nomeada será a mesma que detém de todo conhecimento para a defesa dos interesses dos negócios do falecido.

Como este instituto pode ser verificado na prática?

A curadoria especial pode ser uma ótima opção para os casos em que o testador é sócio de uma empresa.

Nestes casos, enquanto não finalizado o inventário, o inventariante ou os familiares do falecido é quem ficarão responsáveis por dar andamentos nos negócios do de cujus.

Com isso, os negócios da empresa poderão ser prejudicados a partir das más escolhas destes sujeitos, já que nem sempre o inventariante ou os familiares detêm do conhecimento necessário para gerir assuntos empresariais.

Assim, é possível que o testamenteiro inclua no documento que o curador especial do seu patrimônio, qual seja suas cotas na empresa, seja um sócio ou até mesmo um terceiro que tenha conhecimento no ramo.

O que diz a jurisprudência?

Um dos pressupostos importantes da curadoria especial é especificação dos poderes os quais o curador terá em caso de ausência do instituidor.

Em uma recente decisão do STJ, um curador que agiu acima dos limites estabelecidos no instrumento foi condenado a indenizar a parte, em razão do seu ato ilícito. Vejamos.

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CURADOR ESPECIAL SEM PODERES PARA GERIR O PATRIMÔNIO DA AUTORA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES MOVIMENTADOS INDEVIDAMENTE. DANO MORAL. CONFIGURADO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Não se verifica a alegada violação ao art. 1.022 do CPC/2015, na medida em que a eg. Corte de origem dirimiu, fundamentadamente, a questão que lhe foi submetida, não sendo possível confundir julgamento desfavorável, como no caso, com negativa de prestação jurisdicional, ou ausência de fundamentação. 2. A Corte de origem, analisando o acervo fático-probatório dos autos, concluiu que o ora recorrente, na condição de curador especial em processo penal instaurado contra a recorrida, movimentou sua conta corrente sem autorização e sem possuir poderes para gerir o patrimônio. Além disso, não comprovou que os valores movimentados reverteram em benefício da autora da demanda, razão pela qual deveria indenizá-la pelos danos materiais e morais daí decorrentes. 3. A modificação das premissas lançadas no acórdão proferido na Corte de origem demandaria o revolvimento de suporte fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do que dispõe a Súmula 7 deste Pretório. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ – AgInt no AREsp: 1478101 DF 2019/0090083-8, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/09/2019, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/09/2019)

Conclusão

A elaboração de um testamento por advogado é condição essencial para a segurança do documento, já que, além de redigir o instrumento, o profissional poderá instruir a parte dos possíveis poderes que podem ser instituídos.

 

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Direito Civil

Patrimônio de afetação você sabe o que é?

A aquisição de imóveis na planta é uma das possibilidades de compra de bens muito em alta na última década. Isto se deve às condições favoráveis de pagamento, que auxilia na compra do primeiro imóvel.

No entanto, um dos receios comuns dos compradores é que a incorporadora/construtora não finalize as obras. Por isso, a partir da Lei n. 4.591/1964 ficou instituído o patrimônio de afetação, um fundo o qual as construtoras podem criar para se prevenirem de situações que possam obstar no prosseguimento da obra.

Neste artigo trataremos sobre este instituto. Acompanhe!

Afinal, o que é patrimônio de afetação?

A Lei n. 4.591/1964, alterada pela lei n. 10.931/2004, dispõe em seu art. 31-A o chamado “patrimônio de afetação”. Por este instituto, a incorporadora se obriga a reservar os recursos destinados à construção da obra em um fundo, que estará apartado do seu patrimônio geral. Assim, em eventual execução da empresa, esta reserva não será afetada, já que ela não se comunica com os bens da incorporadora.

Por isso, em caso de falência da construtora, os adquirentes do imóvel na planta terão direito de acesso a estes bens, com o intuito de garantirem o término da obra.

Além disso, em eventual falência, recuperação judicial ou penhora de bens mediante execução da incorporadora, o patrimônio de afetação não poderá ser atingindo, visto que ele é destinado à conclusão da obra pelo qual ele foi instituído.

A importância da fiscalização destas obras

Ainda que o patrimônio de afetação seja um importante fundo voltado para a garantia da construção do empreendimento, existem algumas figuras indispensáveis neste cenário.

Uma delas é o banco que concedeu o financiamento aos compradores. Segundo o Supremo Tribunal de Justiça, o agente financeiro responsável pelo financiamento do imóvel tem responsabilidade solidária acerca do descumprimento contratual da construtora.

Logo, se a construtora não está fazendo o bom uso do patrimônio de afetação ou se não realizou a reserva suficiente para o término da obra (visto que algumas destas empresas somente faz a reserva para o pagamento de tributos e o salário dos funcionários), é possível requerer a responsabilização da instituição financeira que concedeu o financiamento.

Deste modo, em caso de falência da empresa, é possível requerer judicialmente a cobertura dos danos sofridos pelo cliente contra o banco responsável pelo financiamento, em razão deste ser parte desta relação jurídica.

O que diz a jurisprudência?

Uma das questões previstas na Lei n. 4.591/1964 é de que o patrimônio de afetação deve ser destinado à conclusão das obras assumidas pela incorporada.

Recentemente, uma construtora entrou em recuperação judicial e os credores pleitearam a utilização deste fundo para a quitação das dívidas contraídas pela empresa. No entanto, o Tribunal de São Paulo determinou que a utilização deste fundo só seria possível após a comprovação de conclusão das obras as quais este fundo foi destinado. Vejamos.

RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO GRUPO PDG – PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO – HABILITAÇÃO DE CRÉDITO – DISTRATO – EXTINÇÃO DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO – Considerando que um dos objetivos do patrimônio de afetação é segregar e destinar os recursos da incorporação à conclusão das obras, em sendo extinto, os débitos da incorporadora passam a incidir sobre o seu patrimônio geral – Art. 31-E da Lei n. 4.591/1964 – No caso em debate, além da previsão legal, o plano de recuperação judicial dispôs expressamente na Cláusula 1.6.30, que o crédito é extraconcursal (“de responsabilidade do Patrimônio de Afetação”) “enquanto o referido Patrimônio de Afetação não houver sido extinto, nos termos da Lei nº 4.591/1964” – Matéria que já foi objeto de análise por esta 2ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial (AI n. 2023264-85.2018.8.26.0000, rel. CLAUDIO GODOY, j. 10/09/2018) – Enunciado 628 da VIII JORNADA DE DIREITO CIVIL – CJF – Entretanto, no caso vertente, há dúvida sobre ter havido, ou não, a extinção do patrimônio de afetação, fato a ser discutido e analisado em regular dilação probatória – RECURSO PROVIDO, COM OBSERVAÇÃO. (TJ-SP – AI: 22906923220208260000 SP 2290692-32.2020.8.26.0000, Relator: Sérgio Shimura, Data de Julgamento: 31/05/2021, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 31/05/2021)

Conclusão

A aquisição de imóveis na planta a partir de incorporadoras que instituem um patrimônio de afetação pode ser uma vantagem ao comprador, afinal, tal fundo diminui os riscos de não conclusão da obra por falta de recursos.

Por isso, antes de assinar um contrato com a empresa, consulte um advogado. Ele poderá realizar a análise do contrato e, assim, informar se o negócio está protegido ou não deste tipo de infortúnio.

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Direito das Sucessões Sem categoria

Minha família estava no processo de constituição de holding e um dos herdeiros faleceu antes da conclusão. O que fazer?

Aqui no nosso blog já falamos sobre como uma holding familiar pode ser um modelo vantajoso para aqueles que desejam realizar a transmissão de bens em vida e como a estrutura deste tipo de empresa pode ser vantajoso para as empresas familiares. Você pode conferir estes artigos clicando neste link.

Sobre o tema do nosso artigo, vamos ao seguinte caso: você, enquanto proprietário de uma empresa, já pensando na transmissão do seu patrimônio em vida, contrata um advogado para analisar a viabilidade da sua companhia se tornar uma holding familiar.

O advogado atesta a viabilidade e iniciam-se os trâmites para constituição da holding, o que pode levar um certo prazo. Neste período, um dos herdeiros, filho do proprietário e patriarca vem a falecer.

Como a empresa deve proceder neste caso?

Em razão da holding não estava constituída e, em tese, a empresa era de propriedade do patriarca/matriarca, as cotas concernentes ao herdeiro que veio a falecer continuam sendo do proprietário.

Assim, a depender do estágio de constituição da holding, deverá ser refeita o contrato social,  o acordo de acionistas e todos os demais documentos concernentes a criação do modelo de empresa.

Porém, aqui é que muda o cenário: na hipótese de uma holding já formada, com o repasse das cotas aos sócios, em caso de falecimento de um sócio, a cota concernente ao referido retorna ao patriarca e dono da empresa, que, a partir desta nova fração poderá decidir se divide a parte aos demais herdeiros necessários.

No entanto, quando o sócio e herdeiro falece antes da conclusão da constituição, em tese estamos falando de um patriarca, que possui uma empresa e perde um herdeiro necessário.

E, pelas regras do direito civil, se este herdeiro tiver deixado filhos, estes terão direito a sua herança, o que corresponde, também, a cota do herdeiro necessário na empresa.

Isto por que, os netos tem direito a cota da herança do avô quando o seu genitor falecer antes do progenitor, já que eles são considerados representantes do herdeiro.

Assim, neste caso, os netos serão considerados herdeiros necessários e, portanto, terão direito a uma cota na holding familiar.

No entanto, caso o genitor e os irmãos do herdeiro falecido não desejarem que os netos participem como sócios da holding é possível que seja repassado a eles o montante correspondente a parte do sócio, como forma de compensação da herança.

Por isso, é essencial o acompanhamento de um profissional especialista na constituição deste tipo de empresa, pois, a partir da ajuda especialista todo o processo pode ocorrer de forma célere, de modo a evitar este tipo de situação.

Conte com o nosso time de especialistas!

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Direito Tributário

Renúncia e cessão de direito hereditário. Diferenças na tributação. Planejamento sucessório

Ainda que o recebimento de herança possa ser um bom negócio, já que possibilita que o herdeiro obtenha um aumento de patrimônio, a legislação brasileira permite que os herdeiros legítimos renunciem a sua herança ou até cedam o seu direito a terceiros.

A partir disso, existem algumas implicações tributárias que podem dificultar o caminho escolhido, de modo que, mais uma vez, o planejamento sucessório se torna uma alternativa altamente viável. Neste artigo falaremos sobre as opções disponíveis.

O que é a renúncia a herança?

A renúncia à herança consiste ao ato em que o herdeiro declara que não deseja receber a sua cota do quinhão hereditário, não indicando o sujeito que deverá receber a cota.

Nesta hipótese, a parcela destinada a este herdeiro retornará para o montante da partilha e será dividido entre os demais herdeiros, nos termos do testamento ou da divisão legal.

Quanto a tributação da renúncia, como não há transmissão dos bens ao renuciante não há incidência de impostos, como ITCMD.

O que é a cessão do direito hereditário?

A cessão do direito hereditário, por sua vez, consiste ao ato em que o herdeiro primeiramente aceita a sua cota e, em seguida, indica um terceiro que receberá o montante correspondente.

Neste caso, no momento da partilha, será feita a divisão entre os herdeiros e a parte do beneficiário será destinado diretamente ao indivíduo que o cedente indicou.

A respeito da tributação, como há o repasse da herança, será incidido ITCMD na transmissão da herança do de cujus ao herdeiro e, novamente, será tributado o montante na transmissão entre o herdeiro e o cessionário.

Como realizar um planejamento sucessório eficiente?

Dada a possibilidade de dupla tributação sobre o mesmo montante, é possível que o interessado escolha meios rentáveis para que a herança seja transmitida de modo menos oneroso.

Uma hipótese considerável é quanto a criação de holding familiar pelo dono do montante, onde após sua morte, haverá a divisão das cotas entre os herdeiros, que poderão ceder suas partes a terceiros.

No entanto, meio mais eficiente será obtido a partir da natureza da herança recebida.

O que diz a jurisprudência?

Em um recente julgado, o STJ decidiu que não existe nulidade da renúncia de herança quando o negócio jurídico é celebrado por escritura pública e não envolve direito de incapazes, reforçando a regra de que só é possível a renúncia da herança entre indivíduos capazes.

No caso em questão, o problema versava sobre um adquirente de imóvel que foi doado a terceiros antes mesmo da partilha, onde um terceiro herdeiro que foi descoberto após a partilha, através de ação de reconhecimento de paternidade, pleiteava a anulação da cessão. Sobre o caso, o STJ decidiu pela suspensão da eficácia. Vejamos.

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. BEM DETERMINADO. NULIDADE. AUSÊNCIA. NEGÓCIO JURÍDICO VÁLIDO. EFICÁCIA CONDICIONADA QUE NÃO IMPEDE A TRANSMISSÃO DA POSSE. 2. Embargos de terceiro opostos por adquirente de direitos hereditários sobre imóvel pertencente a espólio, cedidos a terceiros antes de ultimada a partilha com a anuência daquelas que se apresentavam como únicas herdeiras, a despeito do reconhecimento de outros dois sucessores por sentença proferida em ação de investigação de paternidade cumulada com petição de herança. 5. A cessão de direitos hereditários sobre bem singular, desde que celebrada por escritura pública e não envolva o direito de incapazes, não é negócio jurídico nulo, tampouco inválido, ficando apenas a sua eficácia condicionada a evento futuro e incerto, consubstanciado na efetiva atribuição do bem ao herdeiro cedente por ocasião da partilha. 6. Se o negócio não é nulo, mas tem apenas a sua eficácia suspensa, a cessão de direitos hereditários sobre bem singular viabiliza a transmissão da posse, que pode ser objeto de tutela específica na via dos embargos de terceiro. 9. Recurso especial não provido. (STJ – REsp: 1809548 SP 2019/0106595-5, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 19/05/2020, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/05/2020)

Conclusão

A renúncia e a cessão de direito hereditário são opções viáveis a herdeiros que não desejam permanecer com sua cota na partilha de bens.

Por isso, conhecendo as opções disponíveis é possível chegar à alternativa mais viável e menos onerosa.

O recomendável é que sempre seja buscado um advogado especialista!

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Direito das Sucessões

Tenho uma única filha. Casei e separei várias vezes. Hoje vivo em união estável. Tenho dois imóveis, posso deixar os imóveis somente para minha filha?

A partilha de bens entre os herdeiros pode causar inúmeras dúvidas aos transmitentes, já que existem regras no ordenamento que determinam que os bens da pessoa devem ser partilhados, também, com o seu cônjuge.

Assim, pense na seguinte situação: Maria tem um filho de uma união. Posteriormente, Maria se casou, obteve bens, partilhou no divórcio e manteve parte do patrimônio com você. Certa vez, ela passa a conviver junto com um novo companheiro, Augusto, mas não obtém nenhum patrimônio em conjunto. Inclusive, Augusto passa a morar com Maria numa casa que é dela. Caso Augusto e Maria venham a se separar, seria devido partilhar Maria dividir estes bens com Augusto? Ou seria possível transferir os bens para o seu filho, com reserva de usufruto, sem nenhum prejuízo em eventual partilha?

A resposta é que, com base neste caso ilustrado, é possível sim a transferência dos bens ao filho. Neste artigo abordaremos as principais questões deste assunto. Acompanhe!

As regras de partilha na união estável

De acordo com o Código Civil, o regime de bens utilizado na união estável é o da comunhão parcial de bens. Assim, a principal regra deste regime é que só serão partilhados em eventual divórcio os bens adquiridos na constância da união.

Assim, pelo exemplo anterior, não seria devido por Maria dividir os bens adquiridos antes da união. Ela só teria obrigação de dividir se os bens fossem adquiridos enquanto ela estivesse com o companheiro.

Deste modo, ela poderá transferir os bens para seu filho sem nenhum prejuízo em eventual divórcio.

O mesmo aconteceria se Augusto também tivesse um filho que fosse viver com o casal: Maria não possui nenhuma obrigação de dividir seus bens com seu enteado, ainda que ela tenha assumido alguma responsabilidade perante a criação da criança.

Agora o cenário mudaria se Maria adquirisse algum bem enquanto estivesse em união estável. Por exemplo, se Maria comprar um veículo enquanto estava em união com Augusto, ainda que ele não tivesse contribuído com nenhum valor, em caso de separação, seria obrigação de Maria dividir o valor deste carro com Augusto.

Como transferir os bens para os herdeiros ainda em vida?

Verificada a possibilidade de transferência dos bens para os herdeiros, é importante entender como esta transferência pode ser feita.

Uma das principais possibilidades é transferir os imóveis ao filho e estabelecer uma reserva de usufruto, de modo que, enquanto o genitor estiver vivo, ele poderá usufruir dos imóveis transmitidos.

A transferência dos bens aos herdeiros é uma boa alternativa para proteger os bens de futuras uniões, que poderão alegar terem parte destes bens.

O que diz a jurisprudência?

Um dos pontos importantes da união estável é que, ainda que um dos companheiros adquira algum bem durante a união, se o valor utilizado para a aquisição tenha sido obtido antes deste período, não será devida a divisão.

Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu um caso com este teor. A decisão explica bem como acontece na prática. Vejamos.

APELAÇÃO. Ação para reconhecimento incidental de união estável cumulada com pedido de partilha de bem imóvel em razão do divórcio. Sentença que não reconhece a existência de união estável ao tempo da aquisição do bem que se pretende partilhar. Inconformismo da parte autora. Alegação de que a união estável se iniciou em 1996, casamento contraído em 2013 e divórcio em 2015, tendo sido, o imóvel, adquirido em nome da apelada em 2004. Eficácia patrimonial da união estável. Lei vigente na data da aquisição do patrimônio. Mesmo admitindo que as partes fossem companheiras na época, o que não se confirmou nas provas dos autos do processo, não é possível reconhecer o direito à partilha da coisa, considerado o regime de comunhão parcial de bens estabelecido (artigo 1.725 do Código Civil) e a aquisição da coisa com o dinheiro obtido pela apelada em razão da dissolução de seu anterior casamento com terceiro, obstando a partilha de acordo com o disposto no artigo 1.659, inciso II, do Código Civil. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJ-SP – AC: 10073709620168260084 SP 1007370-96.2016.8.26.0084, Relator: Rogério Murillo Pereira Cimino, Data de Julgamento: 18/12/2020, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/12/2020)

Conclusão

Entender o regime de casamento e das uniões estáveis é primordial para a compreensão da partilha de bens, em eventual divórcio.

Por isso, existem contratos e outros meios de proteger o patrimônio em caso de estabelecimento de uma nova união. Seu advogado poderá te auxiliar neste assunto.

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Direito Civil

Ministro do STJ autoriza que devedor utilize seguro garantia em lugar do depósito em dinheiro e ou penhora

O mercado constantemente se adequa às necessidades dos seus clientes. E, o mais interessante disso, é que essa adequação também se aplica aos processos judiciais.

Dentro do rol de procedimentos judiciais existentes, a execução é, sem dúvida, a forma que mais pode lesionar um indivíduo. Isto por que, antes mesmo de ser proferida uma sentença, o sujeito poderá ter que entregar parte dos seus bens à justiça, para que eles possam ser utilizados como garantia, caso seja reconhecido o dever do executado de pagar o valor discutido no processo.

A partir daí, surgem o seguro garantia, visando ofertar uma garantia de pagamento da dívida, sem comprometer o patrimônio do executado. Mas será que o judiciário tem aceitado esta modalidade de seguro? A resposta é que sim, e uma recente decisão do STJ tem grande peso nesse cenário. Acompanhe!

O que é o seguro-garantia?

O seguro-garantia é uma espécie de seguro em que, o executado contrata uma seguradora, informando que está sendo executado e, a partir daí, adquire o título do seguro. O título é emitido com o valor da execução e, com a emissão do documento, o executado deverá apresentar a apólice no processo, quando solicitado que seja apresentado bens a penhora ou valor em dinheiro, a título de garantia.

O valor o qual o executado pagará à seguradora será calculado com base na probabilidade de ele ter a causa ganha, entre outros fatores.

Ao final do processo, se o juiz decidir que o executado tem o dever de pagar o valor o qual está sendo executado, a seguradora é obrigada a repassar ao exequente o montante total da execução, com todas as correções devidas.

Assim, o que se verifica é que há uma relação tripartite, ou seja, ainda que o contratante seja um, o beneficiário será outro.

O que decidiu o STJ?

Ainda que o CPC tenha disposto, em seu art. 835, que o seguro-garantia seja uma forma equiparada ao dinheiro no caso da penhora, diversos juízes acabavam por decidir que, possuindo o executado outros bens a serem apresentados, não seria válido o seguro-garantia.

No entanto, em junho de 2020, atráves do REsp 1.787.457, o ministro do STJ Ricardo Villas Bôas Cueva decidiu que seria totalmente válida a apresentação do seguro-garantia judicial, ainda que o executado possua outros bens a serem penhorados.

O caso envolvia a execução de uma grande empresa do ramo de telecomunicações, que nitidamente possuía diversos bens e valores em dinheiro que poderiam ser apresentados a penhora.

Em sua decisão, o ministro defendeu que “o seguro garantia judicial oferece forte proteção às duas partes do processo, sendo instrumento sólido e hábil a garantir a satisfação de eventual”, dando razão à executada e prosseguindo com a execução.

Assim, a partir daí, diversos executados, que vinham enfrentando óbice na apresentação do seguro como forma de penhora, ganharam um precedente para reforçar o seu direito de utilização deste instrumento nos processos de execução.

O que diz a jurisprudência?

Um dos pontos positivos da decisão do STJ sobre a possibilidade de seguro garantia no lugar da penhora ou depósito em dinheiro, é que, ainda que a decisão não tenha sido revestida de repercussão geral, ela vem sendo seguida pelos demais ministros do Superior Tribunal de Justiça.

A recente decisão da Ministra Nancy Andrighi vem reforçar esta questão. Vejamos.

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL. PENHORA DOS BENS DADOS EM GARANTIA REAL. REQUERIMENTO DO EXECUTADO DE SUBSTITUIÇÃO POR FIANÇA BANCÁRIA.  AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO EXEQUENTE E MENOR ONEROSIDADE AO EXECUTADO. JULGAMENTO: CPC/2015. 5. A jurisprudência deste Tribunal Superior firmou-se no sentido de que a preferência estabelecida no art. 835, § 3º, do CPC/2015 é relativa, de modo que é possível deixar de aplicar essa norma em situações excepcionais. Precedentes. 6. Ao interpretar as normas que regem a execução, deve-se extrair a maior efetividade possível ao procedimento executório. Tratando-se de pretensão de substituição de penhora, também é preciso avaliar se estão preenchidos os requisitos estabelecidos no art. 847, caput, do CPC/2015, a saber: (i) a substituição não deve prejudicar o exequente e (ii) deve ser menos onerosa ao executado. 7. O primeiro pressuposto está estritamente relacionado ao princípio da efetividade da execução. Especificamente quanto à substituição da penhora de bem dado em garantia real por fiança bancária, observa-se que o art. 835, § 2º, do CPC/2015 equipara a fiança bancária e o seguro garantia judicial a dinheiro, desde que em montante não inferior ao do débito executado, acrescido de 30%. Assim, por ser fiança bancária dotada de notória liquidez e automaticamente conversível em dinheiro, a finalidade à qual se volta a garantia real – transformação do bem em dinheiro – é, sem dúvidas, mais rapidamente atingida por essa via.. 11. Recurso especial conhecido e provido. (STJ – REsp: 1851436 PR 2019/0357960-6, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 09/02/2021, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/02/2021)

Conclusão

O seguro-garantia pode ser uma boa alternativa para os executados que não desejam ver seus bens ou valores desvalorizados, já que um processo de execução poderá levar anos, o que poderia comprometer o seu sustento ou de sua empresa.

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Direito Previdenciário

Mulher que sofreu violência doméstica pode pedir auxílio-acidente?

A violência doméstica é um problema presente na sociedade brasileira. E esse quadro se agravou com a pandemia do Covid-19, pois obrigou às vítimas a passarem 24h do tempo com seus agressores.

As consequências para a mulher agredida são muitas. E uma delas é o seu afastamento das atividades habituais, como o trabalho.

Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região concedeu o direito ao recebimento de auxílio-acidente a uma mulher que ficou cega após sofrer agressões do marido.

Neste artigo falaremos sobre os principais aspectos deste benefício e como é possível ter acesso a ele. Acompanhe!

Quais são os requisitos para a concessão do auxílio-acidente?

Segundo a Lei n. 8.213/91, o auxílio-acidente é devido ao segurado do INSS que, em decorrência de algum acidente de qualquer natureza, após a consolidação das lesões, ficou com sequelas que reduziram a sua capacidade laborativa habitual.

Além disso, o segurado deverá cumprir quatro requisitos: ter sofrido um acidente, estar na qualidade de segurado no momento do acidente, tenha sofrido uma redução parcial e definitiva para o seu trabalho habitual e que haja nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade.

Aqui vale ressaltar que este benefício possui caráter indenizatório, isto é, é pago como forma de compensar a perda da capacidade laborativa do segurado.

Como a mulher vítima de violência doméstica pode receber o benefício do INSS?

Entendido quais são os requisitos para concessão do auxílio acidente, se faz necessário entender como a mulher vítima de violência doméstica pode receber este benefício.

Como o pagamento do auxílio acidente é feito para aquele que sofreu algum acidente e teve a diminuição da sua capacidade para o trabalho, se a violência a qual a mulher foi vítima resultar nesta diminuição, ela terá direito.

E isto não poderia ser diferente já que, por exemplo, uma pessoa que foi baleada em razão de um tiroteio, que também é uma forma de violência, e em razão disso ela se sofrer redução na sua capacidade laborativa, ela também poderá receber o auxílio acidente.

O caso julgado pelo TRF-4, considerado um dos mais importantes do assunto, uma mulher foi atacada pelo ex-companheiro com uma muleta, o que resultou na perda da visão do olho esquerdo.

Em razão da deficiência, o tribunal entendeu que seria devido pelo INSS o pagamento do benefício.

E isso vem corroborar com a tese de que, não importa a natureza do acidente, se ele resultar na diminuição da capacidade laborativa do segurado ele terá direito ao auxílio-acidente.

O que diz a jurisprudência?

Uma das questões também já decididas pela jurisprudência é quanto as faltas justificadas da trabalhadora vítima de violência doméstica e o pagamento de auxílio doença pelo período em que a mulher esteve afastada.

Em uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, o STJ entendeu que é dever do INSS pagar auxílio doença para mulher que esteve afastada do trabalho em razão de violência doméstica. Vejamos.

RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO EMPREGO. MANUTENÇÃO DO VÍNCULO TRABALHISTA. COMPETÊNCIA. VARA ESPECIALIZADA. VARA CRIMINAL. NATUREZA JURÍDICA DO AFASTAMENTO. INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PAGAMENTO. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. FALTA JUSTIFICADA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO. AUXÍLIO DOENÇA. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARCIALMENTE. 1. Tem competência o juiz da vara especializada em violência doméstica e familiar ou, caso não haja na localidade o juízo criminal, para apreciar pedido de imposição de medida protetiva de manutenção de vínculo trabalhista, por até seis meses, em razão de afastamento do trabalho de ofendida decorrente de violência doméstica e familiar, uma vez que o motivo do afastamento não advém de relação de trabalho, mas de situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher. 2. Tem direito ao recebimento de salário a vítima de violência doméstica e familiar que teve como medida protetiva imposta ao empregador a manutenção de vínculo trabalhista em decorrência de afastamento do emprego por situação de violência doméstica e familiar, ante o fato de a natureza jurídica do afastamento ser a interrupção do contrato de trabalho, por meio de interpretação teleológica da Lei n. 11.340/2006. 3. Incide o auxílio-doença, diante da falta de previsão legal, referente ao período de afastamento do trabalho, quando reconhecida ser decorrente de violência doméstica e familiar, pois tal situação advém da ofensa à integridade física e psicológica da mulher e deve ser equiparada aos casos de doença da segurada, por meio de interpretação extensiva da Lei Maria da Penha. 4. Cabe ao empregador o pagamento dos quinze primeiros dias de afastamento da empregada vítima de violência doméstica e familiar e fica a cargo do INSS o pagamento do restante do período de afastamento estabelecido pelo juiz, com necessidade de apresentação de atestado que confirme estar a ofendida incapacitada para o trabalho e desde que haja aprovação do afastamento pela perícia do INSS, por incidência do auxílio-doença, aplicado ao caso por meio de interpretação analógica. 5. Recurso especial parcialmente provido, para a fim de declarar competente o Juízo da 2ª Vara Criminal de Marília-SP, que fixou as medidas protetivas a favor da ora recorrente, para apreciação do pedido retroativo de reconhecimento do afastamento de trabalho decorrente de violência doméstica, nos termos do voto. (STJ – REsp: 1757775 SP 2018/0193975-8, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 20/08/2019, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/09/2019)

Conclusão

Sendo os critérios para concessão de auxílio acidente, auxílio doença e aposentadoria por incapacidade objetivos, de modo que, não é exigido um modo específico para o acometimento da doença ou incapacidade, é possível que as mulheres vítimas de violência doméstica possam requerer tais benefícios.

Se você ficou com alguma dúvida procure um advogado!

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Direito Civil

STJ: divulgar conversa de Whatsapp sem autorização cria o dever de indenizar. Você concorda?

O compartilhamento de fotos de tela de conversas no WhatsApp é uma atividade comum. Basta entrar em uma rede social para que o indivíduo se depare com postagens de conversas particulares.

Porém, recentemente o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a divulgação destas conversas, seja através de printscreen ou de compartilhamento de áudios, sem o consentimento do outro interlocutor, gera o direito a indenização.

E o que você precisa saber sobre isso?

Primeiramente, para que você entenda o teor da decisão do STJ, é preciso que expliquemos alguns preceitos previstos na Constituição Federal.

A nossa lei constitucional prevê que as comunicações devem ser sigilosas. É por isso que uma interceptação telefônica deve ser autorizada por um juiz e a violação de correspondência é considerada crime no nosso país.

A decisão do STJ

No caso da decisão do STJ, um torcedor de um clube do Estado do Paraná manifestou sua indignação com os dirigentes do clube em um grupo de WhatsApp.

Alguns participantes vazaram parte da conversa e, com isso, o dono das mensagens foi condenado a indenizar os dirigentes, pelas ofensas proferidas.

Porém, a defesa deste indivíduo sustentou que as mensagens foram divulgadas em um ambiente privado, de modo que houve violação não só da sua privacidade, mas também da privacidade dos participantes do grupo.

E o caso chegou ao STJ. Lá, a ministra Nancy Andrighi sustentou que o sigilo das comunicações está diretamente ligado à liberdade de expressão e que a nossa Constituição resguarda os direitos à intimidade e à privacidade.

Deste modo, como a pessoa que divulgou as conversas teve a intenção de expor as manifestações dos outros membros do grupo, de modo a não defender direito próprio, onde claramente houve violação à privacidade e do sigilo de comunicações de terceiros.

Com isso, o sujeito que divulgou as conversas foi condenado a pagar R$ 40 mil em danos morais aos integrantes do grupo do WhatsApp, em razão da violação de privacidade destes participantes.

O que diz a jurisprudência?

A decisão do STJ teve como base o sigilo das comunicações e o direito à privacidade, conceitos amplamente protegidos pela Constituição Federal.

Vejamos o polêmico entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. CERCEAMENTO DE DEFESA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. PREQUESTIONAMENTO PARCIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. ÔNUS DA PROVA. PUBLICIZAÇÃO DE MENSAGENS ENVIADAS VIA WHATSAPP. ILICITUDE. QUEBRA DA LEGÍTIMA EXPECTATIVA E VIOLAÇÃO À PRIVACIDADE E À INTIMIDADE. JULGAMENTO: CPC/2015. 7. O sigilo das comunicações é corolário da liberdade de expressão e, em última análise, visa a resguardar o direito à intimidade e à privacidade, consagrados nos planos constitucional (art. 5º, X, da CF/88) e infraconstitucional (arts. 20 e 21 do CC/02). No passado recente, não se cogitava de outras formas de comunicação que não pelo tradicional método das ligações telefônicas. Com o passar dos anos, no entanto, desenvolveu-se a tecnologia digital, o que culminou na criação da internet e, mais recentemente, da rede social WhatsApp, o qual permite a comunicação instantânea entre pessoas localizadas em qualquer lugar do mundo. Nesse cenário, é certo que não só as conversas realizadas via ligação telefônica, como também aquelas travadas através do WhatsApp são resguardadas pelo sigilo das comunicações. Em consequência, terceiros somente podem ter acesso às conversas de WhatsApp mediante consentimento dos participantes ou autorização judicial. 8. Nas hipóteses que em que o conteúdo das conversas enviadas via WhatsApp possa, em tese, interessar a terceiros, haverá um conflito entre a privacidade e a liberdade de informação, revelando-se necessária a realização de um juízo de ponderação. Nesse aspecto, há que se considerar que as mensagens eletrônicas estão protegidas pelo sigilo em razão de o seu conteúdo ser privado; isto é, restrito aos interlocutores. Ademais, é certo que ao enviar mensagem a determinado ou a determinados destinatários via WhatsApp, o emissor tem a expectativa de que ela não será lida por terceiros, quanto menos divulgada ao público, seja por meio de rede social ou da mídia. Assim, ao levar a conhecimento público conversa privada, além da quebra da confidencialidade, estará configurada a violação à legítima expectativa, bem como à privacidade e à intimidade do emissor, sendo possível a responsabilização daquele que procedeu à divulgação se configurado o dano. A ilicitude da exposição pública de mensagens privadas poderá ser descaracterizada, todavia, quando a exposição das mensagens tiver o propósito de resguardar um direito próprio do receptor. 9. Na espécie, o recorrente divulgou mensagens enviadas pelo recorrido em grupo do WhatsApp sem o objetivo de defender direito próprio, mas com a finalidade de expor as opiniões manifestadas pelo emissor. Segundo constataram as instâncias ordinárias, essa exposição causou danos ao recorrido, restando caracterizado o nexo de causalidade entre o ato ilícito perpetrado pelo recorrente e o prejuízo experimentado pela vítima. 10. Entre os acórdãos trazidos à colação não há similitude fática, elemento indispensável à demonstração da divergência, nos termos do art. 1029, §1º, do CPC/2015 e 255, § 1º, do RISTJ. 11. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. (STJ – REsp: 1929433 PR 2021/0088667-8, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 24/08/2021, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/08/2021)

Conclusão

As trocas de mensagens realizadas por aplicativos de internet se tornaram umas das principais formas de comunicação do século XXI.

Assim, nossa recomendação é que, a partir de agora, os usuários sejam extremamente cautelosos na divulgação do conteúdo das mensagens.

Em caso de dúvidas, consulte um advogado!